domingo, 18 de abril de 2010

O Homem; As Viagens

O Homem; As Viagens

O homem, bicho da terra tão pequeno
Chateia-se na Terra
Lugar de muita miséria e pouca diversão,
Faz um foguete, uma cápsula, um módulo
Toca para a Lua
Desce cauteloso na Lua
Pisa na Lua
Planta bandeirola na Lua
Experimenta a Lua
Coloniza a Lua
Civiliza a Lua
Humaniza a Lua.

Lua humanizada: tão igual à Terra.
O homem chateia-se na Lua.
Vamos para Marte — ordena a suas máquinas.
Elas obedecem, o homem desce em Marte
Pisa em Marte
Experimenta
Coloniza
Civiliza
Humaniza Marte com engenho e arte.

Marte humanizado, que lugar quadrado.
Vamos a outra parte?
Claro — diz o engenho
Sofisticado e dócil.
Vamos a Vênus.
O homem põe o pé em Vênus,
Vê o visto — é isto?
Idem
Idem
Idem.

O homem funde a cuca se não for a Júpiter
Proclamar justiça junto com injustiça
Repetir a fossa
Repetir o inquieto
Repetitório.

Outros planetas restam para outras colônias.
O espaço todo vira terra-a-terra.
O homem chega ao Sol ou dá uma volta
Só para tever?
Não-vê que ele inventa
Roupa insiderável de viver no sol.
Põe o pé e:
Mas que chato é o Sol, falso touro
Espanhol domado.

Restam outros sistemas fora
Do solar a colonizar.
Ao acabarem todos
Só resta ao homem
(estará equipado?)
A dificílima dangerosíssima viagem
De si a si mesmo:
Pôr o pé no chão
Do seu coração
Experimentar
Colonizar
Civilizar
Humanizar
O homem
Descobrindo em suas próprias inexploradas entranhas
A perene, insuspeitada alegria
De con-viver.

Carlos Drummond de Andrade

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