domingo, 27 de dezembro de 2009

Arqueologia das palavras

Um país de velhos

Vamos admitir que velho é sinónimo de maduro, ponderado, reflectido. Vamos admitir também que com o acumular dos anos vem igualmente o acumular de experiência, de cultura, de saber. Teremos assim que Portugal não é apenas um país de velhos, mas também de gente madura, reflectida, inteligente, sólida de saber. Falta-lhe é certo a generosidade da juventude, mas em compensação sobra-lhe poder de reflexão, capacidade de julgamento sereno.
(...) A senilidade será um ornamento muito respeitável, que Portugal oferecerá para a lapela da Europa – uma flor murcha, sem seiva, prestes a secar de um momento para o outro e sem possibilidades de encontrar novas Primaveras. (...)
Em determinada altura recorreu-se à emigração para resolver graves problemas económicos – recurso de desesperado, que provocou mais problemas do que aqueles que resolveu.
Há, espalhados por diversos países do mundo, alguns milhões de portugueses, que procuraram além-fronteiras o que lhes foi recusado na sua própria pátria. Levaram com eles riqueza, juventude, engenho, capacidade de trabalho e revigoramento. Em seu lugar deixaram caquexia, senilidade, incapacidade de produção ... e reprodução. (...)
Aumentam as esperanças de longa vida e de restrição da natalidade, aumentam também as correntes emigratórias, pois o direito de emigrar para angariar meios de vida que faltam no país não pode ser negado a ninguém. Logo, o rápido envelhecimento da nossa população continuará a ser um facto que os sectores respectivos da nossa administração terão de ter em conta.


O texto acima transcrito foi publicado a 16-5-1969, no nº 1562 da revista Vida Mundial, numa rubrica intitulada “Nota da Semana”, sem autor identificado.
É curioso como, quarenta anos depois, este texto podia perfeitamente ter sido publicado na Visão ou na Sábado desta semana, pois mantém uma actualidade impressionante. Mais o mais incrível é que, quarenta anos depois, a nossa administração ou governo ainda nem sequer parece ter começado a pensar de forma séria neste problema.

Devíamos, nós que trabalhamos para sustentar o sistema, começar a perguntar aos nossos excelsos governantes, até quando é que eles acham que, tão poucos, poderão garantir a subsistência de tantos.

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