As últimas semanas indiciam que a justiça ainda se mexe,
apesar da morte anunciada por muitos. Mas, pela forma como o tem feito, mais parece que
a sóbria e sensata figura de olhos vendados e balança equilibrada no braço
firme, participou num qualquer episódio do Extreme
Makeover de onde saiu transformada em vedeta de vaudeville, assim meio
esgrouviada e um tanto galdéria, agitando máscaras suspensas de um bastão num número
musical de gosto duvidoso, mas de grande efeito mediático. Permanentemente rodeada por
um batalhão descontrolado de jornalistas, fotógrafos e câmaras de televisão que, pasme-se, sabem sempre antes – e se gabam disso – tudo o que
está a ou vai acontecer nas mais secretas investigações policiais, circula a alta velocidade em carros de vidros fumados no que mais parece uma cena do Knight Rider...
Como se circo mediático fosse lei ou - o que ainda é pior – justiça. Perante este cenário é legítimo perguntar: afinal, vivemos
num estado de direito em que polícias e tribunais funcionam como deve ser? Ou em algum momento obscuro da nossa história - e que nos passou terrivelmente desapercebido - nos teremos transformado numa
república abananada onde a justiça se tornou linchamento
mediático e desproporcionado de figuras quanto mais públicas e poderosas melhor para dar a ideia de que algo está mesmo a funcionar? Onde a investigação dos crimes parece ser conduzida e, claro, divulgada em primeira mão, pelos jornais e não pelas polícias competentes para o efeito. Com o ministério público a dar o dito por não dito ou a deixar dizer que depois logo se verá...
As últimas semanas foram férteis em grandes furos
televisivos e jornalísticos, mas quantas condenações sairão dos julgamentos que se lhes seguirão, se
houver julgamentos? E quantos anos demorarão esses mesmos julgamentos? E
quantos recursos haverá pelo caminho até vários crimes terem, afinal,
prescrito? E depois talvez ainda seja necessário repetir o próprio julgamento porque,
naquele dia, alguém com responsabilidade não fez o que era suposto fazer...
Como anónima cidadã esta forma de fazer justiça
em praça pública, com afirmações e acusações que se avolumam nos jornais, televisões e redes sociais de hora a hora até se transformarem numa gigantesca bola de neve que
destrói tudo à sua passagem, deixa-me inquieta: e se um dia for eu a precisar da
justiça ou que se faça justiça, como será? Não tendo acesso ou qualquer
interesse para os media, estou mais segura do que estas figuras públicas no que à justiça diz respeito? Ou estarei ainda mais tramada porque, ao contrário destes famosos, nenhum canal de televisão me dará tempo de antena para poder declarar-me inocente ou para baralhar ainda mais as coisas?
É pois também por mim
que espero que a este Sócrates – exemplo paradigmático do lado mais sombrio dos
partidos políticos, sejam eles da cor que forem - não tenha sido dado agora um prematuro copo de cicuta (ler aqui).
Sem comentários:
Enviar um comentário