quarta-feira, 28 de novembro de 2012

Frases de cabeceira - 9

elegia a duas vozes


René Magritte: Os Amantes, 1928
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
não faltaram quilómetros de asfalto,
nem a travessia do deserto tornada rotina,
os olhos secos, doridos
e sempre à chegada a estranha sensação
de não estar no lugar certo
                            faltou dizeres o meu nome
                            como se o soubesses

não faltou a mesa, o riso,
a cama, o cio,
o corpo e as suas urgências,
olhos nos olhos, o fogo fátuo da cumplicidade
extinto logo ali, no último soluço do prazer
                            faltou dizeres o meu nome
                            como se me conhecesses

não faltaram palavras, muitas,
ditas e escritas, ocas quase todas,
entre reticências e grandes silêncios
carregados de signos indecifráveis
tudo só para dizer que a conjugalidade, afinal,
mesmo quando não passa de tosco arremedo,
é bem triste comédia
                             faltou dizeres o meu nome
                             como se me procurasses

e também não faltaram coincidências,
afinidades, uns quantos tropeções,
outros tantos (des)encontros,
alguns (re)começos
e todas as variações possíveis do ocaso
                               faltou dizeres o meu nome
                               como se me chamasses

                               e faltou que eu, depois,
                               respondesse ao teu chamamento

sábado, 24 de novembro de 2012

Se não for isto, é algo muito parecido - 12


Há qualquer coisa...

... de hipnótico na forma como as mãos de Pedro Carneiro dançam sobre a marimba. Vi-o hoje ao vivo pela segunda vez, acompanhado por António Carrilho na flauta de bisel. E não há de ter sido a última...

parábola

percebo, pelo som abafado das vozes
cada vez mais distantes e
pela espessura alongada das sombras
que estou a meio caminho

naquele estranho,
inexacto e equidistante ponto
que medeia entre o princípio e o fim
de tudo

e talvez devesse ficar por aqui
nesta tépida turvação
das águas paradas

contudo,
nunca me recuso a entrar em cada dia
mesmo quando
a pretexto de cansaço
ou de um certo vento
que gela os ossos,
me deixo ficar mais um pouco,
aparentemente,
a marcar passo

quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Revista de imprensa


Decepção à regra

Edward Hopper: Early Sunday Morning; 1930
















Sentar-me 
ver os outros passar é o
meu exercício favorito. Entretém.
Não esgota.
É gratuito. Neste meu jogo-do-não
são os outros que passam
(é aos outros que reservo a tarefa
de passar). Lavo daí os pés.
Escrevo de dentro da vida.
Pode até parecer que assim não
chego a lugar algum mas também quem
é que quer ir
ao sítio dos outros?

João Luís Barreto Guimarães, in Luz Última
Lx: Livros Cotovia, 2006

segunda-feira, 19 de novembro de 2012

L'affaire Jonet

Sobre as muito comentadas declarações da diretora do Banco Alimentar (ver aqui) não tenho muito a acrescentar: entendi algumas coisas e até concordo com elas; outras são, de facto, muito estranhas. Sobre o excesso de consumismo e de bens fúteis, concordância absoluta. Sobre a necessidade de "reaprender" a viver de forma sustentável, igualmente.

Já sobre a questão do "comer bifes todos os dias" tenho muitas reticências. Isso acontecia (e acontece) também porque a carne e muitos outros alimentos são agora produzidos à escala industrial, na maior das indiferenças pela sustentabilidade do planeta de que a senhora falava e, sobretudo, no maior desrespeito pelos próprios animais de que nos alimentamos. Só isso explica que a classe média (que em Portugal nunca passou de uma faixa social de pelintras com saláriozinho garantido ao final do mês) pudesse ter dinheiro para comprar e comer bifes todos os dias. É que os bifes, hoje em dia, pouco mais custam que uma lata de atum. Mas, e na sua própria casa, como é? Pois, se calhar, não come bifes todos os dias. Mas não será porque tem as possibilidades financeiras que lhe permitem variar mais o cardápio familiar?

Outra conclusão que se retira do palavreado da senhora é que, de uma certa forma, por termos andado a comer bifes todos os dias, é que estamos em crise, pois isso significa viver bem acima das nossas possibilidades. Em última análise, a culpa da crise é, portanto, da tal classe média que andava um bocado mal habituada e que, agora, felizmente, já empobreceu o bastante para se ver forçada a mudar de proteína. Não deixa de ser essa também uma das teses defendida aqui.

Mais curioso ainda tem sido ler as reações dos "fazedores de opinião" de serviço. Todas elas têm uma coisa em comum: procuram separar as águas. Ou seja, separar a pessoa da instituição que dirige. O que é positivo, diga-se. Assim, segundo Marcelo Rebelo de Sousa (ver aqui), ela “não tem de ser tão boa a falar como a fazer”. Argumento estranho se pensarmos que uma instituição como o Banco Alimentar vive mesmo é de "passar a palavra certa" para conseguir que as pessoas vençam a indiferença e a inércia habituais e 'façam, isto é, contribuam com o seu próprio dinheiro para esta causa. 



É, aliás, graças a esta generosidade popular, que o Banco Alimentar (BA) tem conseguido alargar a sua intervenção social, prestigiando assim a sua diretora. Ou, para usar uma expressão mais "popular", a senhora faz omeletes porque, justamente, tem ovos para as fazer. 

Talvez por isso, aqui se defenda que "o Banco Alimentar é maior do que alguns minutos de televisão". Também concordo. Agora, do que não tenho quaisquer dúvidas é que a própria Isabel Jonet, afinal, não é maior do que estes mesmos minutos. E a sua desajeitada tentativa de, aqui, dar algumas coisas ditas por não ditas e trocar outras em muitos miúdos confirma isso mesmo.

O problema é que todos acreditávamos que a diretora do BA, por ter, justamente, vinte anos de percurso nas causas sociais não iria cair neste tipo de palavreado. Aliás, é por causa do prestígio alcançado com esse percurso que é chamada com regularidade à televisão para falar e para opinar sobre a atualidade. Mais uma razão para pesar bem o que diz. Estranho também é que uma pessoa como ela não tivesse ainda percebido isso.

No fim de contas, o que vale aos velhos e aos pobres deste país é que o Banco Alimentar é bem maior do que Isabel Jonet. E é maior porque é 'alimentado' por todos nós que, durante as campanhas de recolha, contribuímos generosamente pois sabemos que anda por aí muita gente a passar fome. Estávamos bem arranjados se assim não fosse! E é também isso que vale à Dra. Jonet.

Eles, que são especialistas na matéria,

lá sabem do que falam.

Imagem daqui

Frases de cabeceira - 5

"O mundo é de quem não sente. A condição essencial para se ser um homem prático é a ausência de sensibilidade. A qualidade principal na prática da vida é aquela qualidade que conduz à acção, isto é, a vontade. Ora há duas coisas que estorvam a acção - a sensibilidade e o pensamento analítico, que não é, afinal, mais que o pensamento com sensibilidade.  Toda a acção é, por sua natureza, a projecção da personalidade sobre o mundo externo, e como o mundo externo é em grande e principal parte composto por entes humanos, segue que essa projecção da personalidade é essencialmente o atravessarmo-nos no caminho alheio, o estorvar, ferir e esmagar os outros, conforme o nosso modo de agir. (1932)"

Bernardo Soares, In O Livro do Desassossego - 1ª Parte
Lx: Publ. Europa-América, 1986, p. 141

domingo, 18 de novembro de 2012

Se não for isto, é algo muito parecido - 9


Frases de cabeceira - 3


Aviso à navegação


Aqui sou eu que faço a meteorologia e se me apetecer que chova copiosamente durante trinta dias seguidos é isso mesmo que acontece. Se me apetecer o contrário, idem, ibidem. Sei que há por aí ruas, cidades, metrópoles até, cheias de sol, inundadas de flores coloridas, onde os pássaros chilreiam 24/7. Nada contra. Mas aqui é outra coisa. Aqui sou eu e ninguém é obrigado a gostar ou sequer a frequentar.

Quem quiser pode comentar. Mas lá está, se esses comentários depois são publicados, ou não, dependerá inteiramente dos meus humores e é sabido que eles são bastante (a)variáveis. E poupem-me à cantiguinha da liberdade de expressão e da democracia que para sistema político já me basta o que temos.

Desenganem-se os navegantes que, precipitadamente, estranham aqui a suposta ausência de pessoas. Na verdade há as suficientes e necessárias para mim e é tudo quanto basta. O que não há, de facto, é imagens delas (por razões que só a mim interessam) e, a partir de agora, nem sequer haverá de mim (embora não tenha a ingenuidade de pensar que é possível a alguém esconder-se durante muito tempo na grande rede para quem sabe, verdadeiramente, como procurar).

O que aqui não há também é paciência para aguentar quem confunde a blogosfera com uma rede social e este blogue em particular com uma caixa de correio sentimental. Menos paciência ainda com quem confunde cortesia e boa educação com disponibilidade para ir ali ao lado fazer masturbação verbal numa sessão de chat, sempre com a forte possibilidade de, entretanto, ainda darmos uma rapidinha num hangout via webcam. Na verdade, eu ainda sou do tempo em que era tudo manual mesmo. E é justamente assim que continuo a preferir. E ainda assim só quando, como e com quem me apetece, se me apetece, obrigada. É claro que nada tenho contra a troca de umas ideias, de um cumprimento, nem sequer contra uma boa conversa, ou umas piadas inteligentes, pois até tenho bastante sentido de humor. Mas,  ponto final.

Sempre que aqui posto uma imagem ou um texto é porque é exatamente isso que quero dizer ou publicar. Se os outros entendem, ou não, não me interessa. Não estou à procura de ser entendida. Por isso, entrelinhas(?!), mensagens subliminares(?!), provocações(?!). Poupem-me a extrapolações delirantes, conclusões precipitadas, preconceitos, paranóias e infantilidades várias.

De facto, aqui não há portões, muros ou vedações, por isso qualquer um é livre de poder entrar à vontade, atravessar, voltar, ficar, ... Mas há, contudo, um limite: o do respeito. Dele faço muita questão de não abdicar.  Por isso, aqui, quem respeita também é respeitado. Mas quem não o faz sujeita-se às consequências. E dos tempos em que era ‘boazinha’ não me ficaram saudades.

Aqui, navegar à vista é perigoso porque há baixios escondidos sob as águas e o mapa da costa não é de fiar. Fica, pois, feito o aviso.

Subimos ontem à "montanha mágica"

da música de Rodrigo Leão. Para quem lá esteve, essa subida valeu cada minuto.

sábado, 17 de novembro de 2012

Meteorologia dos afetos

Évora - 2012

E você, já foi falar com a Troika?

Mal a "troika" põe o pé em Lisboa para um novo check-up ao doente, começa o desfile: ele é banqueiros (ver aqui), ele é sindicatos (ver aqui), ele é o líder(?) do PS (ver aqui), e agora, até a própria Igreja na pessoa estimável do Bispo do Porto (ver aqui) lá quer ir ao beija-mão. Tornou-se quase obrigatório ir falar com a troika. Mas para quê? É justamente aqui que as coisas ficam um pouco mais nebulosas. Ao que tudo leva a crer, apenas para, no final, terem direito ao correspondente tempo de antena mediático e poderem exibir os dotes de oratória ao povinho: que disseram "não!", exigiram "mudança"; ou que falaram "curto e grosso", reclamaram que assim e assado, frito e cozido... Ou seja, a  velha e constante necessidade que os nossos políticos têm de continuar a atirar-nos areia para os olhos, para assim disfarçar as suas responsabilidades na situação a que chegámos. Na verdade, ainda não ouvi nenhum deles assumir que não há muito tempo atrás andavam a gastar o dinheiro do estado, ou seja, de todos nós, como se não houvesse amanhã. A verdade é que, ainda agora, não há dia que passe sem que os jornais denunciem (e ainda bem que o fazem) vergonhosas situações de exceção (ver aqui) que estão a acontecer em "tempo de austeridade e de sacrifícios para todos", dizem-nos eles. 

Portanto, este cortejo não passa de uma mera exibição de vaidades várias, e este papel de ingénuo bem intencionado assenta muito mal nesta gente toda. Sobretudo porque foram eles que, em conjunto com a tal 'troika' negociaram tudo isto. Como podem agora ter o descaramento de fingir que não sabiam (nem sabem) que a 'troika' faz negócios e apenas se interessa por números e percentagens? Que as pessoas são apenas pendurezas aborrecidas que é preciso suportar para garantir o juro?

Por isso a "troika", estoicamente, lá vai aguentando o frete de todas estas visitas inúteis, enquanto espreita o relógio e suspira pela conferência de imprensa do último dia, para então nos voltar a anunciar, com ar sério e impassível, o que já todos estamos fartos de saber: mais cortes e mais austeridade. 

Perante este cenário ridículo de tão inútil, é caso para perguntar: então e nós, não podemos também reunir com eles? 

Até nem me parece assim nada de muito extravagante, uma vez que nós é que lhes pagamos o  ordenado!

sexta-feira, 16 de novembro de 2012

Se não for isto, é algo muito parecido - 8


Gotinha d'água

(não é das que, agora, se ouvem correr lá fora, mas podia ser)

teoria da eternidade

Marvão: 5/10/2012



















nada é, em si mesmo, eterno:
vida, memórias, afetos...

também nada é eterno
só porque dura uma eternidade:
nem a mais alta montanha,
ou a dor mais profunda

eterna só a intensidade
do breve instante que,
enquanto durou,
valia a pena ter sido para sempre

e a indelével escarificação
que ele deixa na memória

quinta-feira, 15 de novembro de 2012

Canção do tempo

(ou a falta que Ary dos Santos faz à poesia: para abraçar.)


Serei tudo o que disserem:

 (ou a falta que Ary dos Santos faz à poesia: para apedrejar)

Poeta castrado Não!
(...)
Os que entendem como eu
as linhas com que me escrevo
reconhecem o que é seu
em tudo quanto lhes devo:
ternura como já disse
sempre que faço um poema;
saudade que se partisse
me alagaria de pena;
e também uma coragem

uma alegria serena
em renegar a poesia
quando ela nos envenena.

Os que entendem como eu
a força que tem um verso
reconhecem o que é seu
quando lhes mostro o reverso:

(...)
Serei tudo o que disserem
por inveja ou negação:
Demagogo mau profeta
falso médico ladrão
prostituta proxeneta
espoleta televisão.
Serei tudo o que disserem:
Poeta castrado não!

José Carlos Ary dos Santos, "Poeta Castrado, Não!" (excerto)


 

Se não for isto, é algo muito parecido - 7


Frases de cabeceira - 2

"Nous avons toute la vie pour nous amuser, nous avons toute la mort pour nous reposer."
Georges Moustaki  


 
(Mais estranho, ou talvez nem tanto assim, é que ao contrário também funciona)

quarta-feira, 14 de novembro de 2012

terça-feira, 13 de novembro de 2012

Cloud Factory

Se não for isto, é algo muito parecido - 5


Frases de cabeceira - 1

Giorgio de Chirico:  Piazza d'Itália, 1913
Fisicamente, habitamos um espaço, mas, sentimentalmente, somos habitados por uma memória. Memória que é a de um espaço e de um tempo, memória no interior da qual vivemos, como uma ilha entre dois mares: um que dizemos passado, outro que dizemos futuro.
 
José Saramago, In O Caderno, Lx: Ed. Caminho, 2009, 2ª ed.

sexta-feira, 9 de novembro de 2012

Esperança


Evoramonte: 9/11/2012

Quem aqui espera está assim estando
alguém aqui sentado e a sua esperança

Alguém aqui já esteve e o desespero
quem esteve aqui sentindo e desespera

Aqui se espera e está em nosso assento
aqui em esperança estamos nós sentindo

Ao desespero aqui já não assente
quem aqui espera estando em sua esperança

Fiama Hasse Pais Brandão, In Barcas Novas, 1967

encontro marcado

Évora: 9/11/2012

























as tuas palavras atravessaram a distância,
de olhos nos olhos, sem rodeios,
remexeram a poalha fina
de memórias distantes,
quase esquecidas
e alguma coisa em mim se (co)moveu

talvez a mesma que me fez perceber em ti
a idêntica e, contudo, tão distinta chama:

em mim,
as cinzas que o tempo acumulou
amorteceram-lhe o brilho e o calor
é agora apenas um brasido

em ti,
há grandes labaredas
de intenso, ardente fulgor

em mim,
a cavalgada dos sentidos
abranda já a sua marcha

em ti,
vai agora à desfilada

é pois nesse lugar imaterial
e sem idade que é o das palavras
que temos encontro marcado

só lá poderão agora ser nossos
todo o espaço e todo o tempo

até porque elas são
a nossa verdadeira afinidade eletiva

quinta-feira, 8 de novembro de 2012

A profissão docente nunca existiu

pelo menos em Portugal...

Esta reportagem põe um dedo certeiro nas diversas feridas que, neste momento, afetam o sistema de ensino português: formação, vínculo, professores ou funcionários? as opções políticas e os seus custos e consequências em termos humanos e sociais.

Ou como, sem aviso, deixa de haver chão debaixo dos nossos pés...

Se não for isto, é algo muito parecido - 2


O país de Eça, o país de todos nós

 

quarta-feira, 7 de novembro de 2012

E a privatização do Estado?

Como uma espécie de chuva ácida as notícias vão caindo diariamente nas páginas da imprensa:

"Não podemos ter medo de pensar no património como um negócio"
 

Parece que Saramago - que já tinha proposto a ideia há alguns anos atrás, quando a situação não era nem de perto de longe comparável ao que estamos a viver agora -  afinal, não era assim tão radical quanto isso:

«Privatize-se tudo, privatize-se o mar e o céu, privatize-se a água e o ar, privatize-se a justiça e a lei, privatize-se a nuvem que passa, privatize-se o sonho, sobretudo se for diurno
e de olhos abertos. E, finalmente, para florão e remate de tanto privatizar, privatizem-se os Estados, entregue-se por uma vez a exploração deles a empresas privadas, mediante concurso internacional. Aí se encontra a salvação do mundo...
E, já agora, privatize-se também a puta que os pariu a todos»


José Saramago, in Cadernos de Lanzarote – Diário III; Lx; Ed. Caminho; 1998

Privatizar o Estado? E porque não? Afinal, ele até tem sido um muito bom negócio (pelo menos para alguns).

E, já agora, de caminho, privatizem-nos também a alma para ser tudo ainda mais fácil!

terça-feira, 6 de novembro de 2012

Dar o sermão

"O que só digo e sei, por teologia certa, é que em qualquer parte do mundo se pode verificar o que Isaías diz dos príncipes de Jerusalém: Principes tui socii rurum: «os teus príncipes são companheiros dos ladrões». E porquê? São companheiros dos ladrões, porque os dissimulam; são companheiros dos ladrões, porque os consentem; são companheiros dos ladrões porque lhes dão os postos e poderes; são companheiros dos ladrões, porque talvez os defendam; e são finalmente seus companheiros, porque os acompanham e os hão de acompanhar até ao inferno, onde os mesmos ladrões os hão de levar."


Pe. António Vieira, In Sermão do Bom Ladrão

Sermão proferido em 1655 na Igreja da Misericórdia de Lisboa (Conceição Velha), mesmo na cara destes:




E só é de lamentar que tão certeiras palavras não tenham sido ditas nas fuças destes,


ou destes


e de mais uns quantos iguais a eles...

segunda-feira, 5 de novembro de 2012

"Tatuagem" musical

surripiada daqui (não resisti, confesso)


e com esta para a troca, ou os novos caminhos do Fado português.



E por falar em almoços grátis...

A Portugal Telecom (PT), essa empresa com larga cópia de anos a ser amicíssima dos clientes, vai agora "oferecer" nada menos que 16 gigas de armazenamento gratuito na cloud. A todos os portugueses, até mesmo aos que, fartos de tão desinteressada amizade, há muito já que foram para a concorrência.
 
Tendo em conta os lucros que a PT, em ano de crise, consegue obter só no mercado nacional (ver aqui) eu diria que não faz nada demais... até porque cada um dos clientes, ao longo destes anos todos, já pagou de certeza várias "clouds".
 
Imagem daqui

A inteligência do Estado

Todos os dias o Estado se afadiga para criar umas centenas de "novos pobres" a quem tem depois que dar comida nas quase 500 cantinas sociais já existentes no país: assim por alto, umas 34 mil refeições diárias (ver aqui). A coisa tem tido um tal sucesso que está mesmo prevista a abertura de mais 100 destas cantinas até ao final do ano.
 
Motivo mais do que suficiente para se poder concluir que a restauração "low cost" - termo fino para designar a velhinha "sopa dos pobres" - tem grande futuro neste país.  Ou melhor, ao que tudo indica, é  cada vez mais o único futuro que este país tem para oferecer a 15,7% da população (segundo os números oficiais, que os números reais serão certamente bem superiores - ver aqui), and counting. Custo previsto deste Programa de Emergência Alimentar para 2013: assim por alto, uns 50 milhões de euros. Sem qualquer retorno, claro.

Pena é que almoços tão baratos tenham, afinal, um preço tão elevado (desemprego, pobreza, indigência, ...) para os cada vez mais numerosos clientes. Não tenho dúvidas de que, se pudessem muitos dos clientes trocariam o almoço grátis pelo emprego que perderam. E com benefícios para o Estado!
 
Ah, e diz que é para poupar dinheiro... Imagine-se!

domingo, 4 de novembro de 2012

De passagem, a paisagem - III


Depois das primeiras chuvas logo o outono começa a desenrolar sobre a terra ainda sequiosa a carpete verde que abafará os passos gelados do inverno.

N4 - Elvas: 4/11/2012

Também as árvores enfeitaram já a copa de cores variadas, como adolescentes que fizessem uma festa antes de ir dormir.

N4 - Terrugem: 4/11/2012

E sempre ao longe a poderosa tutela das nuvens que parecem erguer-se do chão como montanhas carregadas de água...

N4 - Estremoz: 4/11/2012