segunda-feira, 31 de outubro de 2011

"Por mais que eu tente são só palavras"

O cidadão 7.000.000.000

Nasceu durante a madrugada, algures no mundo, o cidadão 7 biliões. É um número grande, talvez demasiado, para ser tão pequeno, frágil e inocente, num mundo feito de números grandes, cada vez maiores.  


Sete biliões é um número ao mesmo tempo simbólico e paradoxal, sobretudo para países tão envelhecidos como o nosso e tantos outros do "velho" e do "novo" mundo. Talvez por isso a desmultiplicação de informação na rede. A BBC lançou até uma aplicação online - The world at seven billion - onde cada um de nós pode situar-se no fluxo populacional e que oferece ainda alguma informação estatística contrastante. Como não podia deixar de ser, fui até lá ver para ver onde me situava na vastidão do mundo. O resultado foi este: quando nasci, no início da década de 60, estava bem mais só no mundo (demograficamente falando) do que hoje, o que não deixa de ter a sua ironia...
Ver aqui
Ainda de acordo com a mesma fonte, o crescimento populacional do país é o espelho encolhido do nosso próprio desenvolvimento:
Ver aqui
E a esperança média de vida é o que já se sabe, mas aqui ainda não entram certamente em linha de conta os efeitos, não da crise, mas dos cortes na saúde e nos apoios sociais que o governo  está agora a implementar e que, para muitos idosos pobres vão ser, na prática, uma espécie de eutanásia disfarçada:
Ver aqui
O próprio Fundo de População da ONU tem online um contador populacional atualizado em permanência no sítio http://www.7billionandme.org/. Através da inserção dos dados pessoais o sítio fornece informação ainda mais detalhada sobre a nossa própria evolução demográfica, dezenas de pequenas "estórias de vida" contadas na primeira pessoa e, mesmo à medida da coqueluche do momento - as redes sociais -, a possibilidade de qualquer um de nós publicar e partilhar a nossa própria "estória" (ver aqui), por escrito  e/ou vídeo.
Enfim, são quase tantas possibilidades como habitantes há sobre a Terra, embora se saiba já que a maior parte deles não tem, nem nunca virá a ter, grandes possibilidades.

domingo, 30 de outubro de 2011

A Cage Went In Search Of A Bird

Pour faire le portrait d'un oiseau

e tendo sempre em mente a belissíma frase de Harry Belafonte: "you can cage the singer, but not the song".


Radka Yordanova


Antevisão do futuro que está quase aí a chegar. Ou talvez não

A Microsoft tem estado a divulgar na rede diversos vídeos que pretendem antecipar a forma como as pessoas vão interagir com a tecnologia num futuro que, afinal, está já ali mesmo à frente: 2019.

Na sociedade que a Microsoft agora nos propõe a interacção humana é quase inexistente pois (quase) tudo se resolverá através de pequenos gadgets providos de tecnologia avançada, hologramas e touchscreens. É um quase um delírio tecnológico este futuro que a multinacional assim nos desvenda:


Mas esta sociedade provoca-me arrepios: por um lado promete possibilidades fascinantes mas, por outro, nem é preciso pensar muito para perceber quantos biliões de seres humanos dela ficarão excluídos sem remédio. Pior, excluídos sem dó nem piedade e ad aeternum. Esses, ficarão confinados e condenados a uma espécie de infra-mundo do qual duvido que haja escapatória possível. Ou será que a Microsoft  também tem um plano secreto e paralelo para, até 2019, acabar com a gritante desigualdade entre os países desenvolvidos - altamente tecnológicos - e os outros?

O vídeo sobre o tema da "saúde no futuro" é,  de todos, o meu preferido. Estou até convencida que o ministro que nos anda aí a gerir a saúde como se fosse uma repartição de finanças (ver aqui), com cortes cada vez menos cirúrgicos e mais a eito, anda mesmo é a preparar um novo Serviço Nacional de Saúde assim deste género. Ao que parece, o Dr. House até já foi contactado para chefe de serviço...


Mais do que uma sociedade à parte, este mundo altamente sofisticado e pleno de glamour pertence a um outro plano da realidade. Embora nada tenha contra a tecnologia - antes pelo contrário - espero bem que este "mundo" nunca passe daquilo que é já hoje: pura ficção.

sábado, 29 de outubro de 2011

Vida


René Magritte: Le Tombeau des Lutteurs, c.1960





















Porque é que este sonho absurdo
a que chamam realidade
não me obedece como os outros
que trago na cabeça?

Eis a grande raiva!

Misturem-na com rosas
e chamem-lhe vida.

José Gomes Ferreira, In Poesia II,
Lisboa: Portugália Editora, 1972

sexta-feira, 28 de outubro de 2011

A música é...

... o meu verdadeiro "fim de semana" a todas as horas

Ir e voltar

Norman Rockwell, Going ..., 1947
É uma incontível e infantil expectativa que começa de mansinho logo durante a tarde de 5ª feira e se vai avolumando na 6ª ao longo do dia: já só faltam duas aulas! já só falta uma! acabei! colegas, bom fim de semana!

Expectativa inevitável, apesar de saber que o ansiado "fim de semana"  não é mais do que uma sucessão de rotinas e tarefas: pessoais (compras, roupa para lavar e passar, cozinhar, arrumar...), familiares (resolução de questões práticas de natureza vária) e profissionais (correção de trabalhos e testes, preparação de aulas). Expectativa incontível, apesar de me trazer sempre o doloroso confronto com a tão triste e sofrida velhice dos meus pais. 

Inevitável e incontível expectativa, apesar dos pesares. Talvez por ser uma espécie de meta ultrapassada: chegar ao final de mais uma semana. Talvez porque no meio de tantas coisas a fazer ou a organizar não há tempo para pensar em  nada mais além do imediato.  Não há tempo para pensar, ponto. 

O "fim de semana" que está agora mesmo a começar é uma espécie de anestésico que me entorpece a consciência e dura até domingo ao fim da tarde. Só para o conseguir, valeu a pena ter esperado (aguentado) cinco dias.

E dele regressarei mais do que cansada, esgotada pela correria, porque não parei nem "desliguei" durante todo o tempo e porque uma nova semana já está ali mesmo à minha frente, em tudo igual à que agora terminou.

Norman Rockwell, ... and Coming, 1947

Em boca fechada não entra mosca, mas...

O ministro dos assuntos parlamentares, Miguel Relvas, deixou hoje no ar, em tom sub-reptício - para nos irmos preparando -, a ameaça de corte definitivo de dois meses de vencimento alegando que “há muitos países da União Europeia, cito a Holanda, a Noruega, a Inglaterra, que só têm 12 vencimentos”, ao contrário da “tradição dos países do Sul da Europa, que até se encontram em piores circunstâncias”. (ver aqui)

O senhor ministro Relvas  esqueceu-se foi de nos explicar "what does the asshole have to do with the pants?", ou melhor, qual é a relação entre a realidade sócioeconómica - e respetivo nível de vida - da Holanda, da Noruega e da Inglaterra e a nossa, para poder apresentar semelhante justificação.

Claro que a lógica desta argumentação se entende melhor quando, questionado sobre os últimos desenvolvimentos do caso "Duarte Lima" (ver aqui), seu correligionário no PSD, o ministro logo respondeu que "Gostaria de continuar a acreditar que não é verdade". (ler aqui) Ora, seguindo aqui a linha de raciocínio que o ministro Relvas aplica com tanta ligeireza à questão dos vencimentos, podemos concluir - sem grande margem de erro - que o senhor ministro ainda acredita mas é no Pai Natal, também conhecido como Papai Noel lá na terra das galinhas dos ovos de ouro do dr. Duarte Lima.

quinta-feira, 27 de outubro de 2011

"Cada coisa" tem o seu fulgor

Cada coisa tem o seu fulgor,
a sua música
Na laranja madura canta o sol,
na neve o melro azul.
Não só as coisas, os próprios animais
brilham de uma luz acariciada
quando o inverno
se aproxima dos seus olhos
a transparência das estrelas
torna-se fonte da sua respiração.
Só isso faz
com que durem ainda.
Assim o coração

Eugénio de Andrade, O Sal da Língua,
Porto: Fundação E.A., 1995

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Caminhar no vento

Observo da janela as grandes árvores que, aflitas,  agitam os braços em pleno temporal como se lutassem para conseguir libertar-se e poderem, finalmente, caminhar livres por aí.
E é um pouco assim que imagino essa caminhada no vento...

A Cimeira Europeia em imagens

O costume:

1. A Ordem de trabalhos

 2. A metodologia seguida


3. O resultado
 
Imagem daqui


terça-feira, 25 de outubro de 2011

A "pop history", para desenjoar ainda mais

História da arte, para desenjoar



Com um ar aparentemente infantil...

Encarada do ponto de vista dos gatos...

Como um jogo de palavras...
Vuk Vidor - Art History

 

Como um engenhoso videoclip...


Ou apenas em duas imagens que dizem quase tudo.


segunda-feira, 24 de outubro de 2011

Cada cavadela, cada minhoca...

Então há lá coisa mais adequada e sensata do que nomear este deputado da nação para, nada mais, nada menos do que o Conselho Geral do Centro de Estudos Judiciários?

Parece-me ser excelente esta decisão do nosso areópago nacional que, compreendendo a grande "maré de azares"  de que o dito deputado diz ter sido "vítima", releva assim, com magnânimidade, duas coisas de uma só penada: a óbvia fobia do deputado em relação a perguntas incómodas e a decisão de que o mesmo terá um dia (talvez, quem sabe?) de responder em tribunal por causa da sua notória compulsão por gravadores.

Por tudo isso o nomeia para um sítio onde ele poderá ficar a conhecer melhor o funcionamento da justiça nacional, talvez até travar conhecimento - e quem sabe uma desinteressada amizade -  com algumas das suas mais destacadas figuras...

Como diria o outro: "eu quero aplaudirrr!."

O que me vale é que as belas canções não estão em crise

ao menos isso...

O orçamento de estado, a pedra no sapato e a sem-vergonha

Sobre as medidas de austeridade previstas no OE para 2012 nem vale a pena estafar muito mais vocabulário. Só há uma coisa que correu menos bem, talvez por não ter sido prevista: que as generosas pensões, subsídios e subvenções vitalícias dos (ex-)políticos viessem  logo agora à praça pública quando todos sabemos como, nestas coisas do dinheiro, quanto maior for a quantia envolvida, maior convém ser  a discrição... Aqui estão alguns bons exemplos divulgados hoje na imprensa, nem por isso muito exemplares. Contudo sempre é bom verificar a "pluralidade" desta lista:

Imagem daqui

Só que esta pedra no sapato do OE é um autêntico calhau pois há muitos mais, como este, ou melhor, esta:

Imagem daqui, pág. 19
 Nada mais nada menos do que a diáfana presidente da Assembleia da República, "reformada" em 1998 (ainda no tempo dos escudos), aos 42(?) anos de idade e com uma generosa verba que agora acumula com o resto, claro está, e que dá para comprar alguns alfinetes.

É por estas e por tantas outras que fico surpreendida quando leio  aqui que, pelo andar apressado da carruagem, o dinheiro para as pensões e reformas acaba em 2040. Não me surpreende o mais que certo esgotamento do dinheiro, surpreende-me é ainda haver dinheiro para tantos anos, apesar de tudo. E ainda têm a lata de andar a dizer que não estamos numa situação comparável à da Grécia...

De qualquer forma, que não restem dúvidas: o que é preciso é haver dinheiro suficiente para pagar os subsídios e reformas aos ex-políticos ainda no ativo - sobretudo no setor privado. Quanto a todos os outros, ou seja, a imensa maioria que vegeta com reformas de pouco mais do que trezentos euros/mês, eles que se aguentem, até porque já estão habituados a passar necessidades... e não lhes custa tanto. Os ex-políticos é que, coitadinhos, tem que ser gradual, muito gradual mesmo, para se poderem ir adaptando à ideia...

Coisas que me abespinham, encanitam e irritam - VI

A 3,59€ cada código de barras, é um belo concurso, não há dúvida...


domingo, 23 de outubro de 2011

De certa forma, todos somos responsáveis...

pelo que aconteceu ao Rafael (ler notícia aqui). É revoltante a passividade boiesca com que estamos a permitir que as nossas escolas sejam cada vez mais autênticos centros de tortura física e psicológica, quando nelas devíamos estar era a formar os cidadãos do futuro. Em vez disso, estamos a criar pessoas de/malformadas. Mais do que decadente, a nossa sociedade está é doente. E muito!
Quando leio notícias destas, e por muito que me custe admiti-lo, acho que  já estivemos bem mais longe disto!

Godfried Schalcken, Rapariga segurando uma vela (pormenor),
c. 1670-1675, óleo s/ tela
 


A navegar nas ondas deste mar

logo eu, que até costumo pensar que não gosto muito de jazz... mas afinal

"Que bem prega Frei Tomás..."

... mas eu dispenso o sermão: não me serve o que ele diz, e muito menos o que ele faz. (ver video aqui). E como já era de prever, os acólitos também não lhe ficam atrás. (ver aqui)

Addenda - Em tom agastado, o Sr. Ministro veio agora há pouco anunciar que "renuncia" ao dito subsídio de alojamento que, apenas por curiosidade, tem um valor idêntico ao do meu salário liquído mensal como funcionária pública (ler aqui). Mas, agasturas à parte, o certo é que o sr. ministro começou por aceitar o tal subsídio de muito bom grado apenas porque podia e a lei o permite e, se tudo isto não tivesse vindo a público, continuaria a aceitar apenas porque podia e a lei o permite, claro está... Já percebemos todos que a decência - também há quem lhe chame "vergonha na cara" - não é coisa que "assista" ao senhor ministro. Mas também aqui não há nada de novo talvez porque, em Portugal, certas estórias mal contadas têm uma queda para a repetição... (ver aqui)

sábado, 22 de outubro de 2011

A vida em 20 momentos (mais coisa, menos coisa)

São 20 os momentos-chave de toda a nossa vida, defende Robert Rowland-Smith no livro Uma viagem com Platão - uma leitura filosófica dos momentos que marcam uma vida (Lua de Papel, 2011). Estive a conferir a lista como quem faz um daqueles testes das revistas:

1. nascer (aconteceu num final de setembro, não fui vista nem achada, mas cá estou)
2. aprender a andar (não me lembro deste)
3. aprender a falar (e deste também não; mas ainda bem que aconteceram e foram bem sucedidos)
4. entrar na escola (o pequeno e vetusto edifício de uma só sala, rodeado por grande um recreio murado, com carteiras de madeira escura de tampo inclinado, quadro de ardósia com estrado, a régua sobre a secretária, sem percebermos muito bem o que estávamos ali a fazer e porquê...)
5. equilibrar-se na bicicleta (aprendi sozinha numa ladeira íngreme que descia do monte até cá abaixo e que depois tinha que subir a penantes com a bicicleta ao lado; foram aí umas dezenas de descidas vertiginosas até perceber que me conseguia equilibrar e pedalar ao mesmo tempo e o contentamento por ter conseguido fazê-lo sozinha; ainda hoje me lembro das dores no rabo na manhã seguinte; só vários dias depois é que me consegui voltar a sentar no selim)
6. fazer um exame (lembro-me vagamente do primeiro de todos, na 3ª classe, ainda hoje guardo o papel algures, e de como tinha que sair tudo direitinho para a Professora ficar contente comigo)
7. dar o primeiro beijo (o primeiro, a sério, foi quando andava no liceu e, como a experiência do meu parceiro era tão pouca quanto a minha, achei que a coisa estava muito sobre-valorizada; só bem mais tarde é que percebi a razão de tanto alvoroço...)
8. perder a virgindade (outro dos mitos sobre-valorizados da nossa sociedade;  foi quando, onde e com quem eu escolhi mas bom, bom mesmo, só foi depois...)
9. passar no exame de condução (pago com o meu próprio dinheiro, foi como um ritual de passagem à condição de mulher independente, confirmada com o carro próprio)
10. votar pela primeira vez (teve a importância das coisas que se fazem pela primeira vez; até hoje só falhei um ato eleitoral por causa de uma gripe fortíssima que me deixou de cama uma semana: as eleições legislativas em que o PS/Sócrates obteve a maioria absoluta; quando vi os resultados, à noite, a minha intuição não me enganou: fomos de mal a pior e eu falhei esse momento crucial; não me conformei até hoje e, como as coisas estão, nunca perdoarei a mim mesma este "lapso de cidadania")
11. arranjar emprego (foi como se me tivessem aberto uma porta para o mundo - ainda que o mundo fosse só a possibilidade de sair da casa dos meus pais)
12. apaixonar-se (é empolgante, exaltante, único; é uma luz que se acende cá por dentro; é uma força que nos empurra para a frente sem hesitações; é, acima de tudo, uma perda de tempo, um inútil desperdício de energia)
13. dar o nó (não, obrigada)
14. ter filhos (agora já é tarde)
15. mudar de casa (há já algum tempo que me apetece re-fazer o «ninho» noutro sítio, mas falta-me o dinheiro para)
16. atravessar uma crise de meia-idade (estou a)
17. divorciar-se (do ato legal sei o que ouço dizer... a mim chega-me o sofrimento da separação)
18. reformar-se (a grande incógnita...)
19. viver a terceira idade (se não fosse pedir muito... sempre era melhor do que sobreviver)
20. partir com estilo (e com dignidade, isso é que era mesmo bom, assim tipo la cerise sur le gâteau)

É uma lista interessante esta que Rowland-Smith agora propõe aos seus leitores, mas eu substituiria sem hesitar alguns dos momentos que não vivi ou que não foram assim tão "chave" quanto isso - por força das circunstâncias e/ou por decisão própria - por dois ou três outros relacionados com os acasos felizes que trouxeram certas pessoas para dentro da  minha vida e do meu coração e com as misteriosas coincidências que me têm possibilitado vivências imprevistas, mas ao mesmo tempo tão bonitas e, essas sim, bem marcantes... só que tenho à frente uma espécie de menir feito de testes de 10º ano...

sexta-feira, 21 de outubro de 2011

Atar (algumas) pontas soltas

No passado mês de junho, já Álvaro Santos Pereira aceitara o convite de Passos Coelho para ser ministro, quando publicou esta postagem:
Ver aqui
Nem sequer foi necessário alongar-se muito. Meia dúzia de números foram suficientes para concluir que (e nunca é demais repetir, pois há por aí muitos a quem não convém lá muito entender a verdade e alguns estão até no governo) "... como as estatísticas da OCDE (...) demonstram, Portugal permanece um país extrememente desigual." (sic)

Vêm(-me) estas afirmações mesmo a calhar, agora que o governo que Álvaro Santos Pereira integra acha (e muito bom povo com ele, claro está) que a função pública não passa de uma corja de privilegiados que auferem vencimentos elevadíssimos que têm levado o país à ruína.

Claro que quem assim fala e decide em consonância sabe que as coisas não são bem assim, mas convém-lhe, e muito, que a populaça arranje um bode expiatório para descarregar a fúria e a frustração, enquanto ficam convenientemente na sombra alguns dos tais 1,1% da população portuguesa que, de acordo com as estatísticas oficiais citadas pelo agora ministro Santos Pereira, auferem quantias superiores a 100 mil euros anuais. Até porque já foram, são e certamente vão continuar a ser pessoas influentes, que sabem mexer os cordelinhos e têm acesso a gente poderosa (e nunca se sabe quando é que vamos precisar de um favorzinho...)

Há, por isso, que manter um low profile no topo da pirâmide e para tal não há como desviar as atenções para outro lado, neste caso, para baixo, para a sua base. É lá que pululam os párias do sistema, isto é, os funcionários que levam pouco mais de 500 ou 600 euros mensais para casa e também os que, sendo tão ou mais qualificados e competentes que os do topo da pirâmide, não têm é as relações de amizade - também há quem lhes chame cunhas - que lhes permitam aspirar a mais do que mil a mil ou quinhentos euros por mês (no Luxemburgo, qualquer mulher a dias ganha o dobro disto).

E quem são então os que integram esta casta divina que gravita na altas esferas do estado e das suas mais relevantes instituições, ou então à frente dos destinos das mais importantes e poderosas empresas nacionais? Aqui ficam apenas alguns exemplos:
c) 400 políticos portugueses que, apesar de estarem ainda na "flor da idade" e de ocuparem cargos muito bem remunerados, auferem sem pudor de uma "pensão vitalícia" (ou mesmo várias) e acham muito bem.

Mais ainda. Como legislam em causa própria, e de parvos não têm nada (parvos somos nós que lhes temos permitido o acesso ao pote do ouro sem quaisquer restrições), arranjaram a seu tempo a maneira de se safar e muito airosamente a tudo quanto é corte ou restrição: os funcionários públicos que paguem, nós nada temos com isso! Era o que mais faltava, ainda segundo o tal de Mira Amaral.

O próprio professor Gaspar, numa das suas recentes lições, afirmou c-o-m-t-o-d-a-s-a-s--l-e-t-r-a-s, que nas pensões vitalícias dos ex-políticos não se mexe, ainda que algumas tenham valores absolutamente indecorosos face ao panorama socioeconómico do país, aliás como se pode conferir aqui e ainda que o custo anual dessas tais pensões/subvenções seja qualquer coisa como isto:
Imagem daqui
Ora eu, que sou funcionária pública há mais de vinte anos, que estou mesmo cá em baixo no primeiro nível da pirâmide e daqui nunca sairei, acho toda esta conversa sobre os funcionários públicos e as suas enooormes regalias (ainda por cima sentenças pagas a peso de ouro e que, se forem ditas na RTP, mais uma vez me saem do bolso) do outro mundo e nunca como agora estive tão tentada a entrar para a política. Afinal, também sou filha de deus e, pelo menos, sempre tinha direito a uma reformazita jeitosa, além de vitalícia. 

Mas, voltando ao princípio, por escassos segundos quase senti pena do bem intencionado, ingénuo e um tanto "verde" Álvaro... Ou talvez nem tanto assim, dado que aceitou integrar o governo, quanto mais não seja para servir de engodo.

quinta-feira, 20 de outubro de 2011

O poeta é um ser que inventa a importância relativa das coisas...

... porque "a importância de uma coisa não se mede com fita métrica nem com balança nem com barômetro etc. / (...) a importância de uma coisa há que ser medida pelo encantamento que a coisa produza em nós." Manoel de Barros, In Sobre Importâncias

Seis ou Treze Coisas que Aprendi Sozinho
(...)
11

Que a palavra parede não seja símbolo
de obstáculos à liberdade
nem de desejos reprimidos
nem de proibições na infância,
etc. (essas coisas que acham os
reveladores de arcanos mentais)
Não.
Parede que me seduz é de tijolo, adobe
preposto ao abdomen de uma casa.
Eu tenho um gosto rasteiro de
ir por reentrâncias
baixar em rachaduras de paredes
por frinchas, por gretas - com lascívia de hera.
Sobre o tijolo ser um lábio cego.
Tal um verme que iluminasse.

(...)
13

Lugar em que há decadência.
Em que as casas começam a morrer e são habitadas por
morcegos.
Em que os capins lhes entram, aos homens, casas portas
a dentro.
Em que os capins lhes subam pernas acima, seres a
dentro.
Luares encontrarão só pedras mendigos cachorros.
Terrenos sitiados pelo abandono, apropriados à indigência.
Onde os homens terão a força da indigência.
E as ruínas darão frutos

Manoel de Barros, In  "O Guardador das Águas",
Ed. Civilização Brasileira, 1989.

Coisas que me abespinham, encanitam e irritam - V


Tá-se mesmo a ver que sim, sobretudo se o método for o Photoshop...

quarta-feira, 19 de outubro de 2011

Uma autêntica pérola descoberta por acaso...

... numa das prateleiras da videoteca da escola. Ganhei o dia ao vê-lo.

A crise e as receitas de cozinha...

De acordo com a definição do Banco Mundial, uma das instituições financeiras que, à semelhança do nosso bem conhecido FMI, prospera à custa dos juros cobrados aos países pobres e em sérios apuros económicos e sociais, existem no mundo dois tipos de pobres:  os que tentam sobreviver com menos de 1 dólar por dia (pobreza extrema) e os que tentam "esticar" uma verba entre 1 e 2 dólares diários (a pobreza dita moderada). A mesma instituição estima ainda que 1 bilião e 100 milhões de pessoas vivam em pobreza extrema a nível mundial e que 2 biliões e 700 milhões tenham níveis de consumo inferiores a 2 dólares diários.

Ora, de há uns tempos para cá, começaram a proliferar nos media rubricas deste tipo:
Imagem daqui

Imagem daqui
Neste caso, as receitas divulgadas no sítio do Correio da Manhã variam entre 4 e 6 € por refeição, para 4 pessoas. Os próprios hipermercados já tinham aqui há tempos disponibilizado fichas com receitas de cozinha, e respetiva lista de ingredientes, a um custo médio de 4 € para 4 pessoas: é o caso do grupo Sonae com as suas "Receitas em Conta". Depois foi a SIC que, em março, emitiu uma reportagem sobre a campanha "Comer bem é mais barato", promovida pela Associação Portuguesa de Nutricionistas (ver aqui e aqui). Nela se divulgavam sete receitas com custo médio de 1 € por pessoa, embora o objetivo fosse sobretudo comparar o elevado preço de certos alimentos processados, dispendiosos e pouco recomendáveis para a saúde, com o baixo custo de uma refeição mais saudável.

Só que hoje tinha na minha caixa de correio o último número da revista que o Montepio Geral envia aos seus associados e foi aqui que, sem aviso, levei (também eu) um autêntico murro no estômago: então não é que quatro dos melhores chefs de cozinha portugueses, todos responsáveis por restaurantes de grande prestígio, propõem agora as "Marmitas de chef" por...1 €. A grande ironia disto é que, devido às suas especificidades e critérios de exigência, a alta cozinha prima, justamente, pelo desperdício.

In Montepio, nº 3, outono 2011
Ora se até já os mais (re)conhecidos chefs portugueses andam a trabalhar para gastar apenas 1€ por refeição propondo uma original (ou talvez nem tanto assim) salada de feijão frade com atum e acrescentando em discreta nota de rodapé o custo acrescido - e, por isso mesmo, opcional - de um simples ovo cozido(!), então não me restam quaisquer dúvidas. Quer isto dizer que, pelos tais critérios do Banco Mundial, estamos já dentro dos limites da pobreza moderada (2€ diários para alimentação) e a resvalar perigosamente para o limiar da pobreza extrema. E também não deixa de ser curioso que esta proposta de receituário "para lá de económico" venha, justamente, de um banco...

Mas tudo isto, claro está, foi ainda antes da apresentação pública das linhas gerais com que o próximo orçamento de estado nos quer descoser a vida. Imagino que os chefs de cozinha já devem andar atarefadíssimos a inventar receitas ainda mais em conta, isto é, de 0,50€ para baixo. E, pelo andar da coisa, daqui a um ano vamos vê-los todos a inventar receitas a custo zero...

Pelo sim pelo não fui espreitar outra vez o mapa da fome no mundo que a FAO divulga anualmente:

Fiquei mais descansada, claro: no ano passado não constávamos. Este ano, apesar das já tão numerosas "receitas por 1€/pessoa/refeição" que circulam por aí,  também não devemos constar, até porqueestamos ainda muito na fase "pobreza envergonhada" e a agarrarmo-nos à ideia de que a crise é temporária e tudo isto ainda tem conserto, quanto mais não seja por "obra e graça do espírito santo, com a imprescindível ajuda da senhora de Fátima".  Mas lá para 2012 somos capazes de já ter direito, pelo menos, ali àquele incipiente tom rosado, indicativo de má-nutrição abaixo dos 5% ...

A nostalgia também é uma música assim

terça-feira, 18 de outubro de 2011

O meu negócio não é números

mas há coisas que me intrigam...

A comissão liquidatária auto-denominada "governo de Portugal" decidiu "cortar nas gorduras do estado", mas pelos vistos resolveu fazê-lo pela via da condenação dos cidadãos à inanição.

Assim, para 2012, o OE agora apresentado propõe-se reduzir de forma drástica uma série de despesas. Julgaríamos nós - tão ingenuos -  que a máquina administativa central, regional e local, a imensidão de institutos públicos, fundações, empresas públicas e assim-assim, levaria um grande corte. Afinal, sem sequer pensar duas vezes, o estado corta mas em áreas que se podem designar como essenciais: saúde, bens de primeira necessidade, educação, emprego, crescimento económico, etc, etc. E a razão é muito simples: é bem mais fácil cortar deste lado em vez de enfrentar os poderosos e manipuladores que proliferam - e prosperam - do lado de lá...

Imagens copiadas daqui

Uma consulta, ainda que apressada, a documento idêntico, mas referente à própria UE, sempre tão cheia de sentenças e sarcasmos para com os PIG's, também suscita algumas considerações interessantes. 

Face aos valores globais apontados para 2011 - e respetiva distribuição - onde é que está o tal corte nas "gorduras" da UE -, receita mágica que eles tanto impingem aos estados membros em dificuldade -, alegando a gravidade da crise económica e financeira mundial? Ou, pelo menos, algum pudor?

Imagem daqui
Vale ainda a pena observar os colossais valores anuais da despesa da máquina administrativa europeia, tal como eles aparecem discriminados neste quadro global constante no mesmo documento:

Imagem copiada daqui
Também não me parece ser de todo fútil compará-los com dados e números relativos a peculiaridades e caprichos de alguns dos mais altos responsáveis da UE que, de quando em vez, aparecem divulgados na imprensa (e que, tanto quanto sei, nunca foram desmentidos por ninguém): ver aqui.

Abreviando: nestas coisas o povo, que é sábio e está fartíssimo de aturar a basófia desta gente, costuma dizer "faz o que eu digo, não faças o que eu faço". E o povo, de que eu também faço parte, sabe bem do que fala e, sobretudo, o que o espera...

segunda-feira, 17 de outubro de 2011

A música é dos poucos "bens" que não conhece, de facto, fronteiras

Portugal: o tempo, o espaço, o modo

ou uma clara, sábia e premonitória lição sobre a qual todos podemos reflectir sem demagogias bacocas:

Portugal:
Esquema apresentado por Ernâni Lopes no "Plano Inclinado" da SIC Notícias (14/8/2010) 


domingo, 16 de outubro de 2011

Os anos 30

na voz límpida de uma portuguesa que anda a espalhar o seu talento pelo mundo: Rita Braga.

Os funcionários públicos

Em Portugal sempre houve, e continua a haver, funcionários públicos

Ver aqui
 e funcionários públicos:

In Correio da manhã de 16/10/2011

Mas também continua a existir em Portugal muita gente com dificuldade em distinguir 'funcionários públicos' e 'funcionários públicos': ler aqui.

Uma espécie de doçura que arrepia a pele...

sábado, 15 de outubro de 2011

15 de outubro: "A forma justa"

Fotografia de Catarina Botelho: O outro nome das coisas















Sei que seria possível construir o mundo justo
As cidades poderiam ser claras e lavadas
Pelo canto dos espaços e das fontes
O céu o mar e a terra estão prontos
A saciar a nossa fome do terrestre
A terra onde estamos – se ninguém atraiçoasse – proporia
Cada dia a cada um a liberdade e o reino
Na concha na flor no homem e no fruto
Se nada adoecer a própria forma é justa
E no todo se integra como palavra em verso
Sei que seria possível construir a forma justa
De uma cidade humana que fosse
Fiel à perfeição do universo

Por isso recomeço sem cessar a partir da página em branco
E este meu ofício de poeta para a construção do mundo

Sophia de Mello Breyner Andresen, In O Nome das Coisas,
Lx: Moraes Editores, 1977.

sexta-feira, 14 de outubro de 2011

Campanha "Vamos Eliminar Portugal" - Best of

Maio de 2011:
Portugueses, depois de escavarmos o buraco do Orçamento...


 Setembro de 2011:
 e de termos autorizado a escavação do buraco da Madeira...

Outubro de 2011:
  estamos agora a cavar o buraco a que cada cidadão deste país tem direito!


Queremos ainda lembrar aos portugueses que há sempre mais um buraco - já escavado ou ainda por escavar - ou dois, ou mesmo três, à espera de ser descoberto a qualquer momento.


Eliminar Portugal.
Junte-se a nós. Colabore nesta campanha!

Enquanto os portugueses, aturdidos, tentam normalizar a respiração

Na Madeira


e em Oeiras


faz-se uma pausa para descontrair...

quarta-feira, 12 de outubro de 2011

As causas do eterno problema da Seleção Nacional do pontapé na bola

O cartoonista Rodrigo na sua "Selecomplicação" avança com quatro, todas elas bastante plausíveis:

Ver aqui
  
Mas a verdade é só uma e é esta: Penso que por serem ricos, bonitos e uns grandes jogadores as pessoas têm inveja deles...