quarta-feira, 28 de novembro de 2012

elegia a duas vozes


René Magritte: Os Amantes, 1928
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
não faltaram quilómetros de asfalto,
nem a travessia do deserto tornada rotina,
os olhos secos, doridos
e sempre à chegada a estranha sensação
de não estar no lugar certo
                            faltou dizeres o meu nome
                            como se o soubesses

não faltou a mesa, o riso,
a cama, o cio,
o corpo e as suas urgências,
olhos nos olhos, o fogo fátuo da cumplicidade
extinto logo ali, no último soluço do prazer
                            faltou dizeres o meu nome
                            como se me conhecesses

não faltaram palavras, muitas,
ditas e escritas, ocas quase todas,
entre reticências e grandes silêncios
carregados de signos indecifráveis
tudo só para dizer que a conjugalidade, afinal,
mesmo quando não passa de tosco arremedo,
é bem triste comédia
                             faltou dizeres o meu nome
                             como se me procurasses

e também não faltaram coincidências,
afinidades, uns quantos tropeções,
outros tantos (des)encontros,
alguns (re)começos
e todas as variações possíveis do ocaso
                               faltou dizeres o meu nome
                               como se me chamasses

                               e faltou que eu, depois,
                               respondesse ao teu chamamento

2 comentários:

platero disse...

antológico

LINDO

FM disse...

Grata pelo elogio. São apenas palavras, nada mais.