Numa ressonância sugestiva do título Sonnets from the Portuguese de Elizabeth Barrett Browning, o Centro Nacional de Cultura patrocina, desde o início deste ano, um sítio de internet chamado www.poemsfromtheportuguese.org , dedicado totalmente à divulgação da poesia portuguesa contemporânea
As traduções inglesas são da responsabilidade de Ana Hudson, e todos os textos se apresentam em versão bilingue. É já significativa a lista de poetas traduzidos de A a Z, de Ana Hatherly a Yvette K. Centeno, passando por Margarida Vale de Gato, Maria Andresen, Maria Teresa Horta, Nuno Júdice ou Vasco Graça Moura.
É deste último o poema
na raiz dos sonhos:
sei que aquela oliveira está ali
sei que aquela oliveira está ali
desde o princípio do mundo, habitando o tempo
e enredada no tempo à tua espera.sei que as nuvens são de lilás escurecendo e resolvem
passar em ronda lenta nas fronteiras já imperceptíveis
do pôr do sol. sei que pressentes que assim terá de ser.
sei que ouvimos o sopro irregular do que diz o noroeste
de sílabas salinas, prolongando os búzios e as ressonâncias
onde ecoa o mar, enquanto a cor das nuvens
for passando morosa do lilás às madrepérolas da noite
e nós dermos as mãos nesse silêncio atlântico. e ainda sei que o vento
se arrepia ao de leve convocando os deuses comovidos
para essa árvore sagrada em que estremece
uma folhagem verde-cinza de estrídulas cigarras
que a acompanham desde o quente começo do mundo,
deste mundo, teu e meu, agora descoberto, ou a reinventar
numa sageza ainda assim sobressaltada,
numa ternura à beira da incandescência,
num princípio de pura alegria a que iremos dando vários nomes,
coisas da alma empenhada na sua liberdade
e em fantásticas lunações e trepadeiras.
sei como sobem jasmins e madressilvas
e as essências do verão em seus caules delicados
emaranhando-se nos sonhos, na raiz crepuscular
e musical dos sonhos. sei que te encontro aí.
in O caderno da Casa nas Nuvens, 2010
Na tradução inglesa lê-se:
in the root of dreams
i know the olive tree has been there
since the beginning of the world, inhabiting time
and intertwined with time, waiting for you.
i know the clouds are darkening in lilac and decide
to go on their slow rounds along the almost imperceptible
borders of the sunset. i know you believe it must be so.
i know we can hear the irregular breath of the northwest
and what its saline syllables say, prolonging the shells and the resonance
that echoes the sea, while the colour of the clouds
will morosely turn from lilac into the mother-of-pearl of night
and we’ll hold hands in this atlantic silence. and i also know the wind
will slightly shiver as it summons the emotional gods
to that sacred tree whose greyish green foliage
will shudder from the stridency of the cicadas,
its companions since the warm beginning of the world,
of this world, yours and mine, now discovered, or yet to be reinvented
in a still disquiet wisdom
in a tenderness verging incandescence,
in a source of pure joy to which we’ll be giving various names,
things of the soul pledged to its freedom
and to fantastic lunations and climbers.
i know how jasmines and honeysuckles rise
and the summer essences are tangled in dreams
around their delicate stems, in the twilight
musical root of dreams. i know i can find you there.
Um belo poema, em qualquer língua.
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