Tenho cada vez mais razões para acreditar que o novo acordo ortográfico é, sobretudo, uma decisão de políticos que querem marcar o seu domínio no território apetecido da CPLP, leia-se as amplas possibilidades de negócio que se abrem em economias florescentes como a angolana. Por isso as razões apontadas por alguns para defender o dito acordo valem o que valem e às vezes nem é preciso um grande esforço para as desmontar. Há alguns meses referi aqui uma entrevista dada por Lauro Moreira, embaixador do Brasil junto da CPLP, durante a qual defendeu o acordo como uma necessidade premente para os editores e livreiros que se viam obrigados ao esforço suplementar de publicar segundo as distintas normas ortográficas de cada país o que, ainda segundo o embaixador, seria uma fonte de prejuízos para as empresas.
Assim de repente, para os leigos na matéria, até parece ser um argumento de peso. Mas verifiquei agora ao ler uma entrevista de Lucia Riff, que a coisa pode não ser bem assim. Disse então esta agente literária que representa os maiores nomes da literatura brasileira que o acordo ortográfico “Não vai mudar nada. Há muitos anos era comum que as editoras – portuguesas ou brasileiras – comprassem direitos para toda a língua portuguesa. Acontecia mais no Brasil. Exportavam-se 100, 200 livros para Portugal, ou vice-versa, e acabava. O livro não viajava mais do que algumas centenas de exemplares através de um distribuidor qualquer.” “Até que dei conta que isso era um erro gravíssimo. O editor brasileiro não estava vendendo absolutamente nada em Portugal. Nós estávamos matando o mercado, matando a possibilidade de o livro ser mais bem explorado e vice-versa. Em Portugal estavam fazendo o mesmo, matando livros que poderiam estar saindo no Brasil.” Decidiu então que, quando vendesse um autor/obra para o Brasil, seria para uma editora brasileira que imprimisse e vendesse no Brasil e para Portugal a mesma coisa.
Assim, segundo Lucia Riff, “O acordo ortográfico pode ter definido onde é que entram ou saem os acentos (...), mas a maneira de escrever, vocabulário, sensibilidade, isso você não transfere por nenhum acordo ortográfico.” Apontando para o novo policial de Tony Belloto - “No Buraco” - (comprado pela Quetzal na Feira do Livro de Berlim), diz ainda que se nele existirem palavras que têm um sentido completamente diferente em Portugal, o editor português vai ter de acrescentar notas de rodapé: “Tem palavras que vocês usam que significam outras coisas para nós. Nisso o acordo não interfere. Quanto ao mercado editorial, não ma parece que venha a ser afectado.”
Parece que, ao contrário do que alguns têm sugerido, os interesses económicos do mercado editorial lusófono - e das editoras portuguesas em particular - se jogam, afinal, num outro tabuleiro que não o do tal (des)acordo ortográfico. É então caso para perguntar: que interesses serve, de facto, este novo acordo ortográfico?
Nota. Excertos da entrevista publicada no Ipsílon, 5/11/2010
Sem comentários:
Enviar um comentário