Sento-me aqui ao teu lado durante uma boa parte do dia. Entre ti e o mundo à tua volta há agora a máscara que te fornece o oxigénio que respiras, os tubos e cateteres que injectam nas tuas veias o soro e os medicamentos de que necessitas.
E sempre que o longo silêncio, apenas quebrado pelo ruído intermitente do monitor cardíaco, se torna pesado, apetece-me invariavelmente gritar: “Mããeee?!”. Exactamente como costumava fazer há já muito tempo, na velha infância, quando acordava de manhã e não sentia a tua presença na casa: “Mããeee?!”, gritava logo. E se tu não respondias de imediato eu continuava a chamar-te, cada vez mais alto, já com voz esganiçada, até que tu, lá do fundo da cozinha, para me fazeres calar, respondias por fim: “siim? o que é que queres?”
Este chamamento, que repeti tantas vezes ao longo dos anos, e que sempre pensei que era uma coisa só minha, afinal não é. É que quase todas as manhãs bem cedo sou acordada por idêntico apelo do miúdo que vive no andar de baixo: “Mããeee?!”. Até o tom esganiçado da voz, sempre que ela demora mais a responder-lhe é semelhante. Logo que a mãe responde ele cala-se como se, de repente, o seu mundo todo estivesse novamente no lugar certo. Exactamente como eu fazia.
E é justamente isso que me apetece fazer agora, aqui. Chamar-te "Mããeee?!", até que acordes e me respondas, já agastada com a minha insistência: "siiim?"... Só mesmo para saber que o meu pequeno mundo ainda continua a estar no lugar certo. Só mesmo para deixar de sentir este vazio cá por dentro.
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