domingo, 22 de maio de 2011

Abre-se a janela bem cedo pela manhã

Edward Hopper Cape Cod Morning, 1950  
espreita-se o mundo lá fora, inspira-se o ar parado, mas ainda fresco, e logo nos entra pelos sentidos uma quase-alegria feita da euforia dos pássaros, do azul límpido do céu, da mistura vibrante de cores que cobre os campos até perder de vista e do ar tão carregado de aromas e de promessas. Uma perfeita sinestesia, exactamente como no quadro de Hopper.
E apetece dizer/aprender com Caeiro, o Mestre incontestado:

Se eu pudesse trincar a terra toda
E sentir-lhe um paladar,
Seria mais feliz um momento ...
Mas eu nem sempre quero ser feliz.
É preciso ser de vez em quando infeliz
Para se poder ser natural...

Nem tudo é dias de sol,
E a chuva, quando falta muito, pede-se.
Por isso tomo a infelicidade com a felicidade
Naturalmente, como quem não estranha
Que haja montanhas e planícies
E que haja rochedos e erva ...

O que é preciso é ser-se natural e calmo
Na felicidade ou na infelicidade,
Sentir como quem olha,
Pensar como quem anda,
E quando se vai morrer, lembrar-se de que o dia morre,
E que o poente é belo e é bela a noite que fica...
Assim é e assim seja ...

Alberto Caeiro, "Poema XXI",
in O Guardador de Rebanhos

Sem comentários: