terça-feira, 3 de agosto de 2010

Do (eterno) antagonismo dos pontos de vista

O ponto de vista de quem está fora (e faz questão disso):

A televisão, amigo Daniel, é o Anticristo, e digo-lhe que bastarão três ou quatro gerações para que as pessoas não saibam nem dar peidos por sua conta e o ser humano regresse às cavernas, à barbárie medieval e a estados de imbecilidade que a lesma já ultrapassou lá para o pleistoceno. Este mundo não morrerá de uma bomba atómica, como dizem os jornais, morrerá de riso, de banalidade, fazendo uma piada de tudo, e aliás uma piada sem graça.”
Carlos Ruiz Zafón, A Sombra do Vento, Publ. D.Quixote, 2007, 10ª ed.pp. 118-119

Nota: Tendo em conta que a acção do romance decorre na época da Guerra Civil de Espanha, o mais provável é que já sejamos mesmo assim e ainda não nos tenhamos dado conta disso.

O ponto de vista de quem está dentro (e está muito feliz por isso):

“- Estás a tornar-te produtivista!
- Penso que não. O trabalho constante cria uma dinâmica exaltante, quanto mais se trabalha mais apetece trabalhar, trabalhar em mais sítios, em mais zonas...
- Que horror!
- Não é nada. Gosto da produção industrial que há na televisão, obriga-nos a ultrapassar sentimentos mornos, condescendências...
- E a qualidade? E o desgaste?
- O fazer muito é excitante.
- Como uma droga?
- Não. As grandes pausas levam a grandes dúvidas, e as grandes dúvidas levam a grandes inibições.”
João Perry, “Os caminhos cruzados de João Perry”, entrevista de Fernando Dacosta para o Público Magazine, nº 234, 28/8/1994.

O ponto de vista do tédio quotidiano (e que é mais o de todos nós):

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