Há tantas ideias perdidas, fracassadas, ignoradas, desconhecidas, desdenhadas... Como explicar o estado quase comatoso em que o país se encontra quando temos tanta gente a ter ideias para o futuro do país? É quase um mistério. Numa entrevista concedida ao Público (5/7/2010), o economista Pedro Pita Barros diz que é, sobretudo, uma questão de mentalidade, de valores e de comportamentos que, ao contrário do que muitos pensam, não se deve a 50 anos da nossa história, mas sim a 800 anos: “Os 50 anos não chegam. Essa mentalidade pequenina também fez desaparecer o ouro do Brasil ou a pimenta da Índia. Não estou a menosprezar o peso dos 50 anos, mas havia coisas que vinham de trás. É por isso que acho que o arejamento internacional do país pode ser fundamental. Os jovens podem libertar-se desse peso.” Pita Barros refere-se ao programa de intercâmbio de estudantes do ensino superior – Erasmus – dizendo ainda que ele é uma verdadeira porta aberta para a mudança: “Já toda a gente percebeu que os miúdos que vão estudar lá para fora não vão ganhar em termos de estudo, mas vão ganhar em termos de uma cidadania europeia. E isso torna-se muito claro quando regressam. Nota-se que foram uma coisa e vêm outra. Que ganharam autonomia e que funcionar no espaço europeu já não lhes faz confusão. Perceberam que há outros hábitos e outras formas de trabalhar. Isso vai criar um choque de mudança. Quando essa geração chegar aos postos de decisão e aplicar alguma dessa vivência, alguma coisa pode começar a mudar. Basta que aqueles que já cá estão não se transformem num travão a essa mudança.”
Claro que esta nova geração – que “já não pensa só em português” - é muito diferente da geração “entalada” que cresceu, estudou e começou a trabalhar já depois do 25 de Abril, mas que se distanciou muito da intervenção política e social, e que é também a minha geração. É uma geração egoísta, muito centrada em si própria e que, por isso, não se empenhou muito na vida pública, mas que também não gerou os grandes empresários e líderes da iniciativa privada, como a geração anterior. Pita Barros descreve-a como uma geração que nunca se conseguiu descolar daquele misticismo do 25 de Abril que os nossos pais (e não nós) viveram intensamente. Talvez também por isso não tenhamos no país uma verdadeira elite no sentido de “pessoas que pensem o país” a médio e longo prazo. Continuamos agarrados ao imediatismo um tanto primário de querermos ver resultados e mudanças rápidas em tudo, até mesmo onde essas mudanças não podem fazer-se assim – como é o caso da educação ou da justiça – e por isso tudo acaba por ficar na mesma ou pior ainda.
Nesta sua entrevista Pita Barros desmistifica também uma certa ideia da universidade e da qualificação superior que anda agora aí em certas cabeças mandantes e que me parece muito pertinente: “A ideia de que as universidades são um sítio de elites onde se pode ir buscar salvadores do que quer que seja é completamente errada. Essas coisas têm de ser construídas todos os dias.”
Também concordo com a visão de Pita Barros sobre a nova geração que aí vem, formada num espírito académico quase “ecuménico”. O problema é que estamos a oferecer-lhes apenas a precariedade: estão permanentemente em estágio ou a recibo verde ou com contratos a prazo. No fundo, estamos a empurrá-los lá para fora e muitos até já foram. Ou seja, estamos quase de certeza a comprometer a tal hipótese – se calhar a nossa melhor hipótese – de mudar as mentalidades e os comportamentos de uma forma mais sistemática e sustentada, levando essa mesma mudança por arrastamento a outras áreas sociais, aconómicas e políticas. A este propósito afirma ainda Pita Barros que “Ou a sociedade sente que este é um problemas de todos, que tems de começar a mudar, que vamos ter benefícios mas também custos – e que os custos têm de ser acautelados, mas que no final todos poderemos ficar melhor -, ou então ficamos conformados com a ideia de que a próxima geração vai viver pior do que a dos pais em todos os sentidos – não apenas em termos materiais mas de precariedade, de incerteza.” O problema é que, olhando para o nosso actual elenco governativo (alguns ministros e secretários de estado são, no mínimo, lamentáveis) e para os que se preparam para governar a seguir e em alternância, não se vislumbra grande mudança, nem sequer grande abertura para que essa mudança se possa começar a fazer, com sentido de responsabilidade e com respeito pelas pessoas.
Na verdade, parece-me que é por estas e por outras que somos, cada vez mais, o “país das oportunidades perdidas”. E é uma pena que assim seja.