Já aqui me tinha referido à forma como os preâmbulos da abundante legislação que em Portugal se produz são, às vezes, bastante mais esclarecedores sobre o pensamento e a as verdadeiras intenções do legislador, do que as dezenas de artigos que se lhes seguem.
Estava então em causa o texto introdutório do DL 15/2007, de 19 de Janeiro, vulgo, Estatuto da Carreira Docente. Foi, em seu tempo, a pedra de toque do consulado da ministra Maria de Lurdes Rodrigues e começava por dizer que À indiferenciação de funções, determinada pelas próprias normas da carreira, veio associar-se um regime que tratou de igual modo os melhores profissionais e aqueles que cumprem minimamente ou até imperfeitamente os seus deveres. Nestes termos, não foi possível exigir dos professores com mais experiência e maior formação, usufruindo de significativas reduções das suas obrigações lectivas e das remunerações mais elevadas, que assumissem responsabilidades acrescidas na escola. A lógica subjacente a este extenso parágrafo é demolidora: o sistema reconhece primeiro como era injusto e permissivo para, logo a seguir, declarar que “não foi possível” corrigir o erro. É caso para suspirar um sentido «Coitadinho do sistema!»
Peremptório, acrescentava depois o legislador: Pelo contrário, permitiu-se até que as funções de coordenação e supervisão fossem desempenhadas por docentes mais jovens e com menos condições para as exercer. Daqui resultou um sistema que não criou nenhum incentivo, nenhuma motivação para que os docentes aperfeiçoassem as suas práticas pedagógicas ou se empenhassem na vida e organização das escolas. (sublinhado meu). Ora foi justamente aqui que eu entrei, pois fui sempre precoce em termos profissionais e desde muito cedo exerci os mais diversos cargos na escola. Por causa de um ano de serviço, fui apanhada na rede e impedida de concorrer à categoria de professor-titular, de tão má memória para muitos, sobretudo para aqueles que, antes de irem para a rua contestá-la, reviraram céus e terra para arranjar os comprovativos necessários à obtenção de mais uns quantos pontinhos que, no concurso, lhes garantissem o mínimo para aceder à senioridade profissional por via administrativa. Cargos exercidos e pontos correspondentes tinha eu, e muitos, mas de nada me serviram.
De um momento para o outro vi-me então impedida de exercer as funções para que tinha formação especializada, experiência acumulada ao longo de mais de seis anos de intenso trabalho e, mais importante ainda, motivação. E tudo porque, por decreto, fui considerada como … demasiado nova. Quando, dois anos depois e por força da contestação, a categoria de professor-titular foi extinta, o mal estava feito: os docentes a meio da carreira – os mais bem preparados de que o país dispõe – estavam reduzidos ao estatuto de “carne para canhão” e tinham as suas legítimas aspirações profissionais reduzidas a pó. Mas sobre isso ninguém falou: nem o ministério, nem os sindicatos. Na verdade, nem os próprios professores, permitindo assim que, sobre as injustiças que então aconteceram - e que nunca foram reparadas - caísse um espesso e conveniente manto de silêncio...
De um momento para o outro vi-me então impedida de exercer as funções para que tinha formação especializada, experiência acumulada ao longo de mais de seis anos de intenso trabalho e, mais importante ainda, motivação. E tudo porque, por decreto, fui considerada como … demasiado nova. Quando, dois anos depois e por força da contestação, a categoria de professor-titular foi extinta, o mal estava feito: os docentes a meio da carreira – os mais bem preparados de que o país dispõe – estavam reduzidos ao estatuto de “carne para canhão” e tinham as suas legítimas aspirações profissionais reduzidas a pó. Mas sobre isso ninguém falou: nem o ministério, nem os sindicatos. Na verdade, nem os próprios professores, permitindo assim que, sobre as injustiças que então aconteceram - e que nunca foram reparadas - caísse um espesso e conveniente manto de silêncio...
Vem tudo isto a propósito do muito badalado “novo” governo PSD/CDS que tomou ontem posse. Insistentemente referido e implicitamente elogiado nos media como um governo “jovem” tem proporcionado à maior parte dos opinion makers do costume, um trabalho de intensa análise: os mais entusiastas – ou mais politicamente simpatizantes – dizem que estão bem preparados para os cargos que vão exercer e que isso se sobrepõe à tal senioridade política que alguns apontam como fundamental. Até a informação de que tem x ministros independentes e y politicamente inexperientes é sempre apresentada como uma coisa positiva para concluirem então que o governo tem todas as condições para fazer um bom trabalho. E terminam sempre com o elogio a renovação de gerações” que estes “jovens” ministros representam.
Não deixa de ser irónico ver como, para exercer cargos administrativos e pedagógicos numa escola, a “senioridade” continua a ser da máxima importância ou, como se costuma dizer, “a idade continua a ser um posto” (a questão de saber se é um bom posto, ou não, não interessa muito), mas, para governar um país mergulhado numa das mais graves crises económico-sociais de sempre, a juventude até pode uma coisa boa e a inexperiência governativa e política podem ser rapidamente colmatadas pela boa preparação evidenciada.
Apraz-me registar esta tamanha evolução de mentalidades num tão curto espaço de tempo. Resta-nos agora perceber se estamos perante os efeitos eufóricos do chamado “estado de graça” por que é suposto passarem todos os governos recém-empossados, ou se estamos apenas a ser manipulados por uma operação de marketing político muito bem arquitectada pelos especialistas na matéria.
Até lá, vou cantarolar baixinho aquele batido refrão do Jorge Palma: deixa-me rir...
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