Em meados do século dezanove, o presidente Abraham Lincoln, proclamou oito leis sobre a governação dos homens e da res publica. Homem de ideias muito à frente do seu tempo - a vontade férrea de abolir a escravatura foi apenas uma delas -, com estas oito máximas revelava não apenas uma visão clara do essencial, mas também um grande poder de síntese, e uma invejável clareza de ideias: Foram então, e continuam a ser hoje, verdades incómodas para muitos ouvidos:
1. Não chegarás à riqueza, se desprezares a economia.
2. Não podes fortalecer o fraco, enfraquecendo o forte.
3. Não podes ajudar o operário, rebaixando quem lhe paga o salário.
4. Não promoves a fraternidade dos homens, incitando ao ódio de classes.
5. Não podes ajudar o pobre, destruindo o rico.
6. Não tentes estabelecer uma segurança bem fundamentada com dinheiro emprestado.
7. Não podes dar ao homem valor e carácter, tirando-lhe a iniciativa e a independência.
8. Não podes ajudar os homens, fazendo tu o que eles poderiam fazer.
Por cá, e na vigência do chamado Simplex, que tudo comanda na administração da coisa pública (e este é um detalhe muito importante), produzimos leis como esta:
“O presente decreto-lei altera o Estatuto da Carreira dos Educadores de Infância e dos Professores dos Ensinos Básico e Secundário, aprovado pelo DL nº 139-A/90, de 28 de Abril, alterado pelos DL nº 105/97, de 29 de Abril, 1/98, de 2 de Janeiro, 35/2003, de 17 de Fevereiro, 121/2005, de 26 de Julho, 229/2005, de 29 de Dezembro, 224/2006; de 13 de Novembro, 15/2007, de 19 de Janeiro, e 35/2007, de 15 de Fevereiro, (...). O presente DL altera, ainda, os DL nº 20/2006, de 31 de Janeiro, e 104/2008, de 24 de Junho.” Só falta acrescentar que esta transcrição constitui o Artigo 1º do DL 270/2009, de 30 de Setembro, ou seja, é o ECD em vigor (que já está a ser renegociado e, em breve, será de novo re-publicado) e funciona como uma espécie de «mote» para as várias dezenas de artigos que se lhe seguem.
Está claro que, nos dias que vivemos, as leis não podem ser reduzidas a máximas, por mais sábias e pertinentes que sejam, mas este ECD constitui uma autêntica demonstração de preciosismo e erudição legislativa. Só justificável porque o objectivo aqui é mesmo contrariar de forma deliberada, na letra e na prática, a Lei 7 de Lincoln: é que professores com valor, carácter, iniciativa e independência não curvam tão facilmente a espinha, por isso, é mais simples reduzi-los a funcionários (cá está o tal simplex). O problema é que a pastilha, embora amarga, está tão bem disfarçada, que alguns dos visados ainda nem deram pelo mau sabor.