Numa interessante análise a que deu o título de “Os problemas de Portugal – Mudar de rumo” (Ed. Colibri, Dez. 2009), Vitorino Magalhães Godinho ao questionar a forma como as organizações internacionais – ONU, UNESCO, FMI, Organização Mundial do Comércio – têm reagido às brutais mudanças de paradigma ocorridas neste início do séc. XXI, tanto ao nível económico-financeiro como poítico-estratégico, escreve que: “Não é aceitável que certos países se transformem em fábricas de mão-de-obra barata e sem garantias sociais. Apanhada no vórtice da emigração, essa fôrça de trabalho poderá melhorar certos círculos no seu país de origem graças às remessas dos ganhos, mas a sua ausência reduz as possibilidades de desenvolvimento aí; e nos países de acolhimento a sua presença contribui para baixar o nível de salários; muitas vezes, apegados a radicionais modos de viver, pretendem impô-los às comunidades que os recebem, não enriquecendo assim a cultura, antes gerando conflitos insanáveis. É nos países de origem que devem encontrar os meios de viver e de usufruirem da cultura, bem como disporem da necessária assistência médica. A emigração, se com retorno, pode contribuir para formar trabalhadores especializados. Tem que se pôr termo ao dumping que, utlizando a mão-de-obra barata e sem direitos, asfixia as indústrias dos países onde o operário é bem pago e tem a sua dignidade assegurada. Cada estado tem o direito de defender os seus naturais. Mas os movimentos migratórios põem outro problema grave. O recrutamento de mão-de-obra, o transporte para os países de destino, e depois o desenrolar do viver quotidiano estão em grande parte sob a alçada de poderosas máfias, que não só exploram violentamente os emigrantes comolevam à formação de bolsas de alta criminalidade, associada a tráfico de armas, de prostituição e de drogas. Impõe-se que os governos dos países de origem e os de acolhimento cooperem em acção vigorosa de desmantelamento de tais bandos e protecção dos trabalhadores e suas famílias.” (p. 11-12)
Visão lúcida e certeira do problema para o qual quem de direito – governo, autoridades, instituições, todos nós - ainda não pensou muito a sério. Embora os movimentos imigratórios não passam despercebidos pois a grandeza dos números não o permite - veja-se agora o caso dos imigrantes brasileiros (ouve-se aliás falar português do Brasil em todo o lado), dos países de leste (já bastante menos numerosos do que há meia dúzia de anos atrás) e da China (por via do comércio) -, na verdade esse tema nunca foi discutido, nem estudado ou analisado a fundo. Tendo em conta que precisamos desses imigrantes para trabalhar, sobretudo para fazerem os trabalhos que os portugueses já não querem fazer (cá, porque lá fora fazem-nos), e que estamos com claros problemas de envelhecimento populacional, seria bom que se começasse desde já a pensar como é que vamos lidar com o(s) problema(s) que venham a surgir no futuro.
Entretanto, o mais irónico é que Portugal sempre foi e continua a ser um país de emigração. Veja-se como a actual crise gerou uma nova vaga de emigrantes, sobretudo entre os jovens, mesmo bastante qualificados. Contudo, ainda não vi ninguém preocupado em perceber quais poderão ser as consequências desta sangria permanente de população.Também por causa da sua condição de emigrante, Portugal até poderia dar bons exemplos nesta matéria ao nível da Europa mas, como sempre, remete-se ao silêncio e ao conformismo relativamente aos 'patrões' da UE. Nesta, como em tantas outras situações, à medida que os problemas forem aparecendo, iremos improvisando, até em termos legislativos, como é, aliás, habitual.
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