“Hoje já não há heróis. Somos gente sem futuro, o futuro acabou há 40 anos. Até aí vivíamos um tempo de promessas, agora vivemos um tempo de paixões tristes. Onde está a cura do cancro, onde está a maravilha em que o mundo se iria transformar com o início do novo milénio?”
Romana Petri (a propósito de O Fabuloso Destino de Dagoberto Babilónio,
In Público, 28/5/2010)
“Depois começou a falar das coisas que antes eram úteis, sobre as quais havia consenso, e que agora inspiravam até mais desconfiança, como os sorrisos, na década de cinquenta, por exemplo, disse ele, um sorriso abria-nos portas. Eu não sei se nos podia abrir caminhos, mas não havia dúvida que nos abria portas. Agora um sorriso inspira desconfiança. (…) Agora sabemos que por detrás de um sorriso pode ocultar-se o nosso pior inimigo. Ou, dizendo de outro modo, já não confiamos em ninguém, começando pelos que sorriem, pois sabemos que estes tentam conseguir alguma coisa de nós. No entanto, a televisão americana está cheia de sorrisos e de dentaduras cada vez mais perfeitas. Querem que depositemos a nossa confiança neles? Não. Querem fazer-nos crer que são boas pessoas, incapazes de fazer mal a alguém? Também não. Na realidade, nada querem de nós. Só querem mostrar-nos as suas dentaduras, os seus sorrisos, sem nos pedir nada em troca a não ser a nossa admiração. Admiração. Querem que olhemos para eles, é só isso. As suas dentaduras perfeitas, os seus corpos perfeitos, os seus modos perfeitos, como se eles estivessem permanentemente a desprender-se do Sol e fossem bocados de fogo, pedaços de Inferno ardente, cuja presença neste planeta obedece unicamente à necessidade de reverência.”
Roberto Bolaño, In “A Parte de Fate”, 2666, p.297
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