sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

A minha sulidão, pedaço arrancado de mim

A minha solidão

(Durante dias e dias andei a ruminar estes versos.)

A minha solidão
não é uma invenção
para enfeitar noites estreladas…

… Mas este querer arrancar a própria sombra do chão
e ir com ela pelas ruas de mãos dadas.

… Mas este sufocar entre coisas mortas
e pedras de frio
onde nem sequer há portas
para o Calafrio.

… Mas este rir-me de repente
no poço das noites amarelas…
- única chama consciente
com boca nas estrelas.

… Mas este eterno Só-Um
(mesmo quando me queima a pele o teu suor)
- sem carne em comum
com o mundo em redor.

… Mas este haver entre mim e a vida
sempre uma sombra que me impede
de gozar na boca ressequida
o sabor da própria sede.

… Mas este sonho indeciso
de querer salvar o mundo
- e descobrir afinal que não piso
o mesmo chão do pobre e do vagabundo.

… Mas este saber que tudo me repele
no vento vestido de areia…
E até, quando a toco, a própria pele
me parece alheia.

Não. A minha solidão
não é uma invenção
para enfeitar o céu estrelado…

… mas este deitar-me de súbito a chorar no chão
e agarrar a terra para sentir um Corpo Vivo a meu lado.

José Gomes Ferreira, Poesia III