domingo, 14 de fevereiro de 2010

Uma história vulgar

Ouvir a tua voz, outrora, era o bastante
Para sentir, enfim, justificada, a vida;
E supor que podia, a partir desse instante,
Abrir, impunemente, ao mundo, confiante,
Minh’alma enternecida.

Fitar o teu olhar, era um deslumbramento,
Que me transfigurava e me fazia crer
Que depois de viver, na terra, esse momento,
- Sereno, como após o extremo sacramento -,
Já podia morrer.

Premia as tuas mãos nas minhas e dizia,
Com profunda emoção: - É só por ti que existo!
- Como foi isto, amor? Do nosso olhar, um dia,
Caiu neve no fogo em que a minh’alma ardia…
Amor, como foi isto?

Passas por mim, agora, e nada me insinua
Ser a tua presença o derradeiro elo
Que me prendia à vida. – E a vida continua!
E tudo, como outrora, (o sol, o mar, a lua…)
Mesmo sem ti, é belo!

Como havemos de ter, nos outros, confiança?
Que humano sentimento a nossa fé merece?
De que servem, na vida, os ideais e a esp’rança,
Se o próprio Amor, - como os brinquedos, em criança -,
Tão cedo, para nós, perde o encanto e esquece?!

Carlos Queirós