quarta-feira, 22 de setembro de 2010

A táctica e a técnica da governação

Isto de governar um país tem que se lhe diga! Por um lado requer táctica, uma vez que a oposição se comporta quase sempre como uma matilha esfomeada à espreita do mais ligeiro sinal de fraqueza para avançar de emboscada sobre a presa, para gáudio dos media e, sobretudo, do povo, para quem uma boa e sangrenta carnificina muito ajuda a espairecer, já desde os longínquos tempos do Circo Máximo. Por isso, um governo que tenha amor ao lugar que ocupa tem, em primeiro lugar, que manter a boa forma física para poder escapar com facilidade à perseguição dos opositores inimigos. Também uma boa camuflagem todo-o-terreno, assim estilo “eu sou bom, sou mesmo muito bom!” transmite uma imagem de segurança e autodomínio que mantém os beligerantes líderes da oposição a uma distância mais ou menos segura, pelo menos até às próximas eleições!

Por outro lado a governação requer também técnica. E julgo que, perante as notícias, comunicações, discursos, declarações, inaugurações e afins vindas a público nos últimos tempos o nosso governo utiliza de forma recorrente a técnica americana do brainstorming ou tempestade de ideias. Nem é difícil imaginar que, às quintas-feiras de manhã, os elementos do conselho de ministros se reunem sob a liderança segura e firme do nosso primeiro-ministro, o qual, uma vez iniciada a sessão, avança com uma nova ideia, uma proposta, um problema, um projecto ou algo assim. Depois, de forma entusiástica, cada um dos ministros diz então a primeira ideia ou palavra que lhe vem à cabeça, enquanto a secretária anota diligentemente tudo o que vai sendo dito. Quantas mais ideias e sugestões melhor, pois nesta técnica como é sabido - e ao contrário do que é mais usual - a quantidade gera, supostamente, qualidade. No fim, é só fazer a triagem das melhores sugestões e propostas, convocar a conferência de imprensa e divulgar ao país e ao mundo os brilhantes resultados de mais uma árdua manhã de trabalho. Assim se compreende bem melhor por que motivo é hoje imperioso avançar com grandes obras públicas para dinamizar a economia mas, no brainstorming seguinte, ou melhor, num outro conselho de ministros, já se anuncie que, afinal, ficam cancelados os concursos internacionais por causa da conjuntura económica desfavorável, coisa e tal. Assim se consegue entender que num dia seja aconselhável estabelecer pactos com o líder da oposição em nome do interesse nacional mas, na semana seguinte, já seja de todo inviável qualquer entendimento, exactamente pelo mesmo motivo. Também é por isso que, num dia, declaram que na Finlândia é que é tudo bom e temos que fazer cá tudo igual mas, no dia seguinte, o sul da europa não tem lições a aprender com ninguém pois somos capazes de encontrar as melhores soluções para os nossos problemas. É por isso que, numa dada semana, a taxa de desemprego está a descer, evidente sinal de que a economia está a recuperar e, uns dias depois vêm dizer que, afinal, ela voltou a subir – mas apenas umas décimas - porque os mercados ainda estão sob o efeito de uma coisa qualquer que ninguém sabe lá muito bem o que é. Esta semana estamos já demasiado endividados mas, na semana seguinte, afinal, está tudo como previsto dentro do orçamento de estado e não se percebe por que razão as taxas de juro da dívida pública sobem sem parar nos mercados internacionais.

É por tudo isto que só posso concluir que, ou estamos a ser governados por uma trupe de funâmbulos malabaristas que andam a treinar para um novo espectáculo do Cirque du Soleil, ou então – o que me parece bem mais provável – por um grupo de seres alienígenas que se apossou dos corpos e mentes dos nossos verdadeiros governantes e está agora apostado em destruir-nos para que os restantes alienígenas, que ficaram muito quietinhos à espera numa nave espacial não localizável pelos nossos sistemas de defesa aérea, possam depois vir colonizar o planeta a partir do centro de operações montado - para nosso grande azar - no território nacional. E agora o mais provável é que, quando chegarmos a tomar consciência desta tal invasão alienígena, já estaremos todos subjugados por estas perigosas criaturas  e impossibilitados de qualquer reacção para as repelir para bem longe. Restar-nos-á então apenas a esperança de uma intervenção de país amigo que nos venha salvar das garras destes monstros sugadores de sangue e a certeza de que, no que à governação do país diz respeito, qualquer semelhança entre a realidade e a ficção não é pura coincidência.