Logo bem cedo pela manhã, um ar fino e frio de outono agarra-se à pele como se quisesse aquecer as mãos nos rostos. Se ainda fosse verão poderia trocar o mergulho nas atlânticas águas pelo banho no suor do teu corpo até sentir na boca o sal que o verão depositou na tua pele. Poderia até olhar a tua respiração adormecida como quem, em frente ao mar, contempla o vai e vem das ondas.
Mas é já outono. As manhãs têm agora este ar fino e frio que me afaga o rosto enquanto caminho. Os banhos de mar deixaram de apetecer e, de repente, o teu corpo ficou distante. O único sinal de presença humana nesta paisagem é, na areia movediça, o rasto escarificado das minhas próprias pegadas. Fico a olhá-lo até que uma onda mais ansiosa avança pela praia como alguém que viesse esticar o lençol ao fazer a cama. Logo depois, quando retorna ao mar, parece que ninguém, nunca, por ali atravessou antes.
Agora que o outono chegou sou de novo como uma praia deserta e aguardo as marés vivas do inverno que virão, primeiro, desfazer os vestígios materiais da tua passagem pela fina areia da minha memória. Aguardo as marés que voltarão, depois, para apagar em mim até a própria memória desses vestígios.