segunda-feira, 8 de março de 2010

Não há fronteiras para o génio

João Magueijo nasceu em Évora há 42 anos. É meu conterrâneo, portanto! Quando tinha 12 anos de idade o pai ofereceu-lhe um livro escrito por Einstein e Infeld na década de trinta do século passado. Numa entrevista à TSF, em 2003 (Programa “Pessoal e Transmissível”, de Carlos Vaz Marques), Magueijo explicou que, nesse livro de divulgação científica, descobriu “A maneira de pensar da Física. A ideia das experiências conceptuais. Estar a imaginar coisas completamente abstractas como, por exemplo, a ideia de movimento, completamente longe de qualquer constrangimento. A ideia de experiências de pensamento, que é um foco central do pensamento do Einstein e que aparece muito vivamente nesse livro. Foi a coisa que mais me afectou.”.

Tornou-se também ele Físico Teórico, com um interesse muito particular pela cosmologia, e há muitos anos que trocou Portugal pela Inglaterra: é professor e investigador do Imperial College em Londres. Tornou-se uma verdadeira “estrela” no mundo científico quando, há dez anos, se atreveu a questionar uma teoria que o próprio Einstein tinha proposto em 1911. Como Magueijo disse então: “...não há dúvida que é a coisa mais controversa que eu tenho feito. (...) Tive uma reacção inicialmente muito negativa, gradualmente mais positiva, mas fazer com que a ideia seja aceita tem sido um processo bastante doloroso”. Tudo começou com a afirmação de Einstein: “nada se move mais depressa do que a luz”, que se propaga a uma só velocidade, constituindo uma das constantes da natureza e um dos pilares da Física moderna. Magueijo fez a si próprio uma pergunta aparentemente simples: e se a velocidade da luz tiver variado ao longo do tempo, tendo sido maior no universo primordial e diminuindo de velocidade à medida que o universo foi arrefecendo e evoluindo? A isto chamou “Teoria da velocidade da luz variável" e, por causa dela, caíu literalmente “o carmo e a trindade” na comunidade científica.

Foi apelidado de arrogante a herege por se atrever a questionar um ícone científico ainda “intocável” na ciência moderna, mas João Magueijo limitou-se a dizer que “No fundo, estamos a afinar a teoria da relatividade. Muito mais do que a destruí-la. Da mesma maneira que a teoria da relatividade estava a afinar a teoria de Newton.”. Esta teoria só pode ser comprovada pela observações astronómicas (nomeadamente, através dos quasars) e pode levar ainda muitos anos até que seja validada experimentalmente. Segundo o cientista, se isso acontecer, “...é completamente impossível prever se alguma tecnologia vai sair daqui ou não. Em termos conceptuais, obviamente, o efeito é enorme. No fundo, é reescrever os alicerces da Física por completo.”.

Para explicar aos  leigos na matéria esta sua teoria escreveu em 2003 o livro “Mais rápido do que a luz – A biografia de uma especulação científica”. Redigiu-o em inglês por considerar que está perfeitamente inserido na cultura inglesa e porque, como segunda língua, a considera “libertadora” em relação à sua própria língua materna. Quando veio a Portugal apresentr o livro declarou que escrever romances era uma hipótese séria na sua vida: “Aliás, tenho tentado, de vez em quando, a brincar. (...) É engraçado, de vez em quando, escrever qualquer coisa.”.

E, sete anos depois, escreveu mesmo: uma biografia. Intitula-se “A Brilliant Darkness – The Extraordinary Life and Mysterious Disappearance of Ettore Majorana, The Troubled Genius of the Nuclear Age”. Parece que é uma espécie de viagem de um físico teórico à descoberta dos mistérios e enigmas da vida e do pensamento de um outro físico teórico italiano - Ettore Majorana -, desaparecido misteriosamente em Março de 1938, aos 31 anos de idade. Sobre esta figura estranha, João Magueijo declara que “Tem-me acompanhado durante toda a minha carreira científica como uma sombra que não consigo afastar, lembrando-me sempre da sua história”; “Não fiquei apenas interessado em saber o que lhe aconteceu, fiquei agarrado à questão: O que o levou a desaparecer?” (in Público, 8/3/2010). Embora tenha descoberto muita coisa sobre Majorana, no final do livro, ao que parece, a pergunta fulcral continua sem resposta. Segundo Magueijo, isso não é o que mais importa: ”...na história de Majorana é também o resto que interessa. Ser um génio é uma deformação profissional, e ele pagou bem caro por isso.” (idem). Escrito em inglês, o livro foi publicado em Dezembro nos Estados Unidos e tem várias traduções já a decorrer para diferentes países. Sobre a sua possível tradução e publicação em Portugal, Magueijo respondeu à jornalista que o entrevistou (Teresa Firmino) que nada sabe.

Basta ver este excerto do documentário realizado pelo Discovery Channel - "A Física de João Magueijo" - para perceber a diferença entre o típico português que anda "lá fora a lutar pela vida" (cá dentro) e este português atípico que foi lá para fora para desfrutar a vida que merece.